30/12/2010

Retrospectiva

Comecei o ano...

Saindo do olho do furacão. Falando com um baiano com nome de gato. Acreditando que os galãs são mesmo os melhores. Conquistando meu teto. Mudando tudo de lugar. Desfazendo-me de uma mesa grande como um elefante branco. Assumindo novos riscos e contas maiores. Marcando meu território profissional. Enrolando meio mundo masculino. Sendo enrolada por outros. Caindo na gandaia com meus amigos. Conquistando novos amigos. Ficando cada vez mais loira. Pedalando até o inverno chegar. Atravessando o Rio da Prata. Conhecendo a Argentina e o Uruguai. Dormindo em um planetário. Amando o tango com todo o coração. Mudando minha postura em relação a muitas pessoas. Acompanhando uma luta contra o câncer alheio. Batendo de frente com peixe grande. Sentindo medo de encontrar quem eu não queria. Mantendo minha antiga mania de diário. Usando sapato com salto. Segurando a onda do lúpus. Observando o quanto de cabelo eu perdia. Ouvindo Cold Play sem parar. Ficando com raiva por perder a bendita touca. Usando o primeiro relógio caro que comprei. Quebrando barreiras antes intransponíveis. Rompendo paradigmas afetivos. Conhecendo meu irmão. Atualizando minhas vacinas. Dando parabéns para o meu pai. Perdendo a paciência com quem não luta. Evitando quem tenta me colocar pra baixo. Consolidando o poder da Corrente do Bem. Fazendo gente que nunca vi abraçar outros estranhos. Testando meu amadurecimento diante de um antigo amor. Alimentando os peixes virtuais todo santo dia. Conquistando novos flertes. Terminando com os velhos flertes. Fazendo planos audaciosos. Esquecendo dos tempos ruins. Conhecendo o cara supostamente perfeito. Exercitando o desapego. Sendo menos possessiva. Sendo mais objetiva. Sendo menos reflexiva. Sendo mais egoísta. Reencontrando velhos amigos dos tempos de escola. Fazendo o makking of do clipe de uma banda. Reencontrando minha amiga de Fernando de Noronha. Acompanhando as “gravidezes” das minhas amigas. Conhecendo vários estádios de futebol. Ficando fissurada no House. Manipulando caras que não prestam. Escrevendo no blog quando realmente batia a vontade. Voltando às raízes muito de vez em quando. Dando um tempo para tudo que me pressionava. Guardando pra mim só aquilo que me fazia bem. Parando de carregar os pesos do mundo.

Terminei o ano...

Vivendo outro furacão. Mudando os rumos profissionais. Conquistando a confiança da minha equipe. Superando mais uma crise existencial pós-aniversário. Divorciando-me oficialmente. Acumulando umas cinco crises de mau humor feroz. Acumulando várias crises de riso incessante. Registrando muitos momentos toscos em webcams. Falando bobagem pra todo lado. Estranhando menos as estranhezas do mundo. Fazendo o perfil da rede social bombar. Pagando contas intermináveis. Ganhando ímãs pra geladeira. Comprando uma máscara de girafa. Fazendo dois mergulhos em Arraial. Conhecendo o Cristo Redentor. Saltando de parapente. Ralando de parapente... Andando de “carro” em um passeio. Visitando as esquisitices da Lapa. Observando a Praia do Espelho do alto. Fazendo novos amigos. Mantendo os bons amigos de sempre. Perdendo a Maria. Sendo madrinha de um casamento. Sendo penetra em outro casamento. Virando a noite em uma boate. Marcando um zilhão de happy hours. Vivendo uma paixonite platônica. Chorando de raiva ao sair na chuva depois de ir a um pub. Conhecendo um cara bacana através de uma simples foto. Descobrindo que não sou a única que não entende como o amor termina. Conhecendo um verdadeiro autor de livros. Deixando mais uma vez de lado os planos de escrever algo que preste. Perdendo meu avô. Tirando foto de um lindo ipê no cemitério. Rindo das coisas que só acontecem na minha família. Descobrindo uns blogs toscos... Reduzindo pela primeira vez em 10 anos a dosagem do corticóide. Tomando florais e homeopáticos. Experimentando a polêmica caraluma. Pedalando de novo e por mais tempo graças à vida virtual que instaurei. Revirando o velho baú em Itaúna. Encontrando minha coleção de Tazos. Doando outras coleções. Interrompendo os escritos no diário pessoal. Rindo muito. Tirando menos fotos. Demorando mais a revelar as fotos. Lendo Comer, Rezar e Amar. Lendo Beber, Jogar e F@#er. Perdendo antigos pudores. Eliminando antigos rumores. Confirmando que eu não estava totalmente errada. Hospedando minha irmã caçula. Mudando minha alimentação. Ficando bronzeada. Machucando o braço esquerdo. Superando enxaquecas. Sabendo que não sou a pior pessoa do mundo. Planejando novas viagens, quase impossíveis. Ouvindo meu pai dizer que me ama. Recebendo um cartão de Natal dele. Ouvindo minha mãe chorar de alegria e de tristeza pelo telefone. Comprando um HD externo. Assistindo NatGeo. Vivendo momentos indecisos no trabalho. Esperando por tempos melhores. Aguardando a total abstinência de corticóides. Usando óculos. Enxergando melhor quem são realmente meus amigos. Descobrindo que sou a Alice. Acreditando de novo.

15/12/2010

Sua Rede, Seu Rótulo

Durante toda a vida somos pressionados a fazer parte de algum tipo de “panelinha”. “Final Clubs”. Você precisar treinar vôlei para fazer parte do time de garotas desejáveis, você precisa jogar futebol para fazer parte do time dos fortes, você precisa tirar boas notas para fazer parte da elite intelectual, você precisa ser popular para fazer parte de todas as festas, simplesmente você precisa, precisa, precisa. Não adianta fugir do processo de seleção natural da sociedade – ele vai encontrar você em qualquer buraco.

Somos etiquetados, classificados em categorias, tendemos a conviver com os semelhantes, segmentando a nossa espécie. Somos agrupados em “estigmas sociais”, praticamente condenados por toda uma vida. Reverter seu status e infiltrar em novos grupos é uma tarefa árdua, onde assumimos atitudes nada espontâneas e optamos por idéias que quase sempre conflitam com nossa personalidade sufocada pelas pressões externas. Não basta ser você, pois você precisa ser “alguém”, como se isso já não fosse uma prerrogativa para o simples “ser”.

Quantos adolescentes hoje não são vampirescos, rebeldes ou de qualquer outra corrente que está na moda apenas para se enquadrarem em algum grupo? Somos seres sociais, temos essa necessidade constante de aprovação do outro em relação ao que somos e representamos. Em 70% do tempo agimos mais em função da opinião alheia do que seguindo nossa própria vontade. Somos moldados pelo meio, mas não porque ele nos influencia, como afirmou o sociólogo... Somos moldados pelo meio porque desejamos fazer parte dele e por isso sentimos a necessidade de buscar semelhanças e semelhantes que nos acolham.

Tenho certeza de que todos que assistirem ao filme “A Rede Social” vão perder alguns instantes refletindo sobre o preço que pagamos para nos afirmarmos socialmente. Claro, não somos tipos incomuns como o jovem Mark, criado do Facebook. Talvez sejamos bem mais parecidos com o “Wardo”, Eduardo Saverin (brasileiro?), que foi fiel ao amigo sem se perder nesta onda de marketing pessoal iniciada no mundo universitário. No fundo nós sempre quisemos ir às festas da Phoenix, ou às baladas mais famosas, ou viver em repúblicas renomadas em Ouro Preto, ou vencer vestibulares das federais, ou aparecer em colunas sociais, sem questionarmos o quão vazio pode ser esse rótulo.

Claro, acho que a grande maioria se divertiu com o fracasso dos remadores mimados... (Fracasso? 65 milhões de dólares como indenização é fracasso?) Sim, socialmente falando, pois a idéia foi “aprimorada” e não nasceu das linhas programadas por eles. A estratégia saiu da cabeça do nerd, que no fundo queria apenas o reconhecimento da ex-namorada. “Ele não é um babaca, mas vivia se esforçando pra ser um”. Como o próprio slogan do filme diz, não dá pra sair dessa empreitada sem fazer inimigos. Mark hoje é o mais jovem bilionário do mundo. Mas a qual “final club” ele pertence hoje? E a qual “panela” ele realmente queria pertencer?

Não sei você, mas também não estou imune a tudo isso. Sua turma da escola, sua turma da noitada, seus vizinhos de rua, sua classe da faculdade, sua equipe de trabalho, seus contatos profissionais, o bairro em que você mora, as marcas que te vestem, as tatuagens que você tem, seu perfil no mumificado Orkut, seu perfil no badalado Facebook – cada um desses grupos é uma escolha sua, satisfazendo suas próprias necessidades de aceitação social. Afinal, o que seria do ser humano sem uma posição na colméia comunitária deste mundo globalizado? Não basta fazer parte do todo, é importante fazer parte daquilo que consideramos especial e melhor: espiar onde o outro se enquadra, o quanto ele é aceito.

Quanto ao filme, excelente montagem. Mark tem cabelos de miojo típicos de um nerd e, para quem sabe do que estou falando, bem semelhante a outro cara de sucesso que tem planos de dominar o mundo. Trilha sonora bem caracterizada, mas fomos poupados das músicas do Justin Timberlake, que no filme representa o cara do Napster. As idas e vindas no tempo, bem marcantes no filme, são fundamentais para nos puxar de volta à nossa realidade de simplórios usuários de uma rede social que modificou a vida de muita gente. Você agora é praticamente onipresente e possui amigos na Bélgica, Kuwait, China. Meet me on Facebook.

12/12/2010

Volante


“A vida acontece enquanto estamos ocupados fazendo planos”... Já soltei o volante há um bom tempo, mas infelizmente ainda não aprendi a deixar tudo caminhar sem minhas intervenções... Ainda tenho a mania de insistir para que tudo seja do meu jeito, no meu ritmo. Tudo feito com uma gula quase doentia, um carma para uma mente ansiosa.

Tudo acaba retornando ao caminho original, afinal, eu forcei a construção do percurso tomado. Sou uma idiota persistente sempre tentando moldar o destino que acho melhor pra mim. E quem disse que realmente sei o que é bom pra mim? Olhando para o passado, fiz várias escolhas ruins. Acertei muitas, mas será que não é tudo uma questão de “quase sorte”?

E sou teimosa. Bato a cabeça constantemente no mesmo prego, remoendo as expectativas criadas sem permissão dos envolvidos. Só não quero que este questionamento perdure, mas preciso aprender logo a lição. Melhor encerrar por aqui antes que eu ache mais piolho em testa de careca.

10/12/2010

À espera


Pensamentos obtusos, meio inflamados, algo assim. Estou num dia de “mente macaco”, mas tenho a sensação de que os galhos em que estou me pendurando balançam sem rumo, se é que realmente existem. Acabo me apegando a idéias que não tem fundamento algum, girando em círculos que no final mais parecem elipses. Nada se forma, mas tudo se transforma. Preciso de uma rota e neste momento estou sem, esperando alguma novidade surgir para me empurrar rumo a uma decisão.

Afinal, estava tudo tranqüilo demais, não é mesmo? Não dá pra achar que vai ser sempre assim - uma paz controlada, conflitos trancados em muros. Quando me sinto atracando em porto seguro, descubro que devo abrir os olhos... Qualquer semelhança, mera coincidência. Não há mar algum sem recifes. Não adianta me nortear por um velho astrolábio que já não funciona neste novo cenário. Estou à deriva, à mercê do deslocamento das placas continentais que não vejo. Ah, como era bom ser Pangéia!

Outro dia alguém me perguntou: o que é estar inebriado? É estar assim, sem saber o que pensar, num “zonzeamento” constante, numa nuvem de ilusão perfurada num vôo improvisado. Tudo rebola em bambolês, vagando como bons sonâmbulos taciturnos. “Estou bem, só não sei aonde isso vai dar”. Como se estivesse em uma ponte, onde a outra margem é feita de neblina. Vale a pena atravessar? Mas será que existe escolha? Sim, sou ansiosa por natureza, só quero que tudo se esclareça. Pois não há verdade que fique oculta e não há medo que perdure.

09/12/2010

Desabafos de um Barranco

Não sei aí, mas aqui é chique morar no barranco. Como outro dia ouvi no ônibus (incluindo os erros de português): “Num sei que mania é essa de rico que insiste em morar nus barranco. Os prédio fica tudo dependurado, esperanu pra cair, enquanto pobre só qué morá numa rua reta”. O barranco é chique em Belo Horizonte. Se você mora numa rua dessas que sobe sem fim, ora, você é quase da nata, mesmo que seja só um emergente. Ou você mora num bairro tradicional, daqueles construídos nas ladeiras do “Curral”. Ou você mora num bairro novo, espaço ocupado pela pressão demográfica e comercial. Ou você mora lá, no Mangabeiras, onde reinaram muitos poderosos políticos.

Mas eis que o barranco é mais uma dessas sutilezas que a gente só percebe quando volta pra casa, debaixo de uma chuva daquelas. Haja enxurrada! De ontem sai tanto lixo, tanta água, tanto bueiro com a tampa virada? Quantos carros brotam e engarrafam o trânsito, quantos não passam correndo jogando água em que está lá, esperando pra atravessar e subir o barranco? Não adianta, se você é “belzontino” ou migrou pra cá, não há como escapar de um bom banho de chuva. Mas pense positivo: melhor se molhar quando está chegando na sua casa e torcer para que a energia não falte durante seu banho quente.

Mas tem barranco que não tem solução. Não falo do barranco paulista que ontem engoliu algumas casas numa zona de risco. Não falo de pousadas que a terra carregou numa colina de uma bonita praia carioca, levando uma mineira acostumada com os barrancos daqui. Não falo de outros tantos deslizamentos e deslizes da vida rotineira de milhares de brasileiros. Falo dos barrancos que nós escolhemos, dos barrancos pelos quais pagamos por opção. Afinal, você muitas vezes topa viver num barranco - nem sempre é obrigado a isso.

Tem dias que estou no alto do morro, esperando pra deslizar abaixo. Esperando a água me empurrar, mesmo que eu não saiba onde tudo vai acabar. É um risco, todo santo dia, esperando a minha própria geografia mudar. Só sei todo planalto sonha ser planície, e vice-versa. Mas não dá pra evitar o frio na barriga, o medo de afogar numa poça de 3 cm, o risco de enfiar um pé no bueiro... Texto desconexo, eu sei, mas não consegui evitar este pensamento, que reflete a sutileza de um cotidiano tão dispare. Enquanto uns optam por morar no barranco, outros são levados pelo morro. Não sei se fico com a igualdade pura ou com a desigualdade irônica...

30/11/2010

Fogo nas ventas


Não deveria estar aqui, agora, feito sonâmbula. O problema é que não existe freio quando sinto um certo engasgo. Cuspindo fogo, seria a melhor descrição. Como se algo me incomodasse e fizesse tudo ficar incômodo. Passo a ouvir o barulho do vizinho, começo a me incomodar com pernilongos, fico curiosa pra verificar o que anda acontecendo nas redes sociais... Mas é que hoje, dentre muitas outras coisas que ouvi, me disseram: "Você é o peso das escolhas que faz". Ou melhor, você sente. E nem se referiam a mim, apesar de se aplicar perfeitamente.


Já errei muito, ainda erro. Não sou uma pessoa fácil, apesar de ter pensado que eu era um "doce" durante muitos anos. Quando quero, sou ácida e teimosa como ninguém. E quando finalmente relevo e abro mão, sempre faço na hora errada. Não sou boa em escolher caminhos desconhecidos. Sempre crio expectativas imediatas: sorvendo tudo que posso em pouco tempo, como se tudo fosse repentinamente acabar. E "acaba acabando", não é mesmo?


Como se fosse Midas, com um maldito dedo podre, sempre tomo a estrada pela contramão. Sim, encontro o que não previa, mas perco o que queria algumas vezes... Não sei dirigir... Por mais que eu tente me planejar, que me esforce pra manter a terra à vista, sempre acabo trombando numa ilha inesperada. Mas não dá pra ser sempre assim. A aventura sempre tem um fim, certo?


Estou extremamente confusa há alguns dias. Sinto raiva de quem não merece, fico com preguiça de quem se esforça em vão, desejo quem não posso ter, uso quem é sincero, jogo criando artimanhas um tanto quanto maquiavélicas, faço piada do que não tem graça. Ou seja, não sou mesmo a pessoa mais inocente do mundo hoje (nem ontem e provavelmente amanhã também). Como cheguei aqui? Longa história, caro curioso aí do outro lado da tela. Tenho certeza de que não sou a única no mundo que de vez em quando se sente suja e com labaredas na garganta. Que Deus nos livre e guarde, amém.

26/11/2010

Salve, Jorge!

Há dias estou pensando em o que escrever sobre o novo “Tropa de Elite”. Mas me parecia redundante repetir os questionamentos propostos pelo filme. Não queria fazer um plágio filosófico... Eis que os últimos acontecimentos chegaram como um rompante de verdade aos nossos olhos. O Rio de Janeiro sempre esteve em guerra, só que antes não víamos ônibus queimados e tanques rodando pelas ruas da cidade? Hoje não estou no Rio, mas na próxima semana estarei.

Estamos completamente alienados quanto ao que os moradores daquelas comunidades estão vivendo ao longo destes dias. É, porque “comunidade” é quase uma coisa genética de carioca: o Rio tem mais “comunidades” do que bairros. Portanto, faça sua análise sobre a proporção que toma uma guerra antes silenciosa e agora estampada nos jornais. Finalmente enxergamos as mazelas das tais comunidades, mas só porque nos saltaram aos olhos e porque chegaram nas nossas ruas bairristas.

Sou mineira, mas sou brasileira. Achar que tudo está distante o suficiente de nossa realidade é um grande erro. Essa peste, como disse o próprio traficante, se espalha. Não vou entrar em méritos políticos sobre como solucionar a guerra civil instaurada, nem tantas outras enfermidades de que padecem nossas sociedades. Não preciso falar de milícias, tráfico, exploração sexual, desigualdade social, analfabetismo. Estamos melhores que antes? Acredito piamente que sim. Porém não melhores o suficiente.

Minha vontade mesquinha apenas repete, ressona baixinho: “só quero ver o bonde, só quero ver o Cristo, só quero saltar de parapente, só quero andar na calçada de ondas”. Mas eu queria tantas outras coisas! Só me resta torcer para que as comunidades de fato assumam seus papéis como “comunas”, em paz.

21/11/2010

Escolhas premeditadas?

Ainda sei pouco sobre o que quero pra mim. Mas sei muito bem o que não quero. Só que chegar ao que realmente queremos é um percurso exaustivo. Não adianta tentar dar passos maiores do que as pernas, nem forçar as cordas vocais gritando no vácuo. O destino sempre apresentará improbabilidades, opções sequer imaginadas. A questão é que a escolha que você fará já está de alguma forma premeditada dentro de você. Você nunca escolhe aquilo que jamais escolheria.

Quando penso nas escolhas que fiz, muitas delas de forma impulsiva e apressada, percebo que nada teria sido diferente quanto às minhas opções. Aquelas circunstâncias moldaram minha decisão, mas no fundo escolhi o que eu queria desde o início, independente do que era certo ou errado. Escolhia o que era certo para mim, o que respondia ao meu próprio plano interior. Você nunca é inocente em suas escolhas.

Os sonhos dos quais abdiquei, as loucuras em que me meti, a independência que instaurei, as situações que vivenciei, tudo – nada foi um acontecimento externo à minha própria decisão. Você erra porque quer, porque aceita o risco. Você erra porque esperava acertar, mas não deixa de ser a sua vontade rumo ao inesperado. Se você pudesse olhar do futuro para o seu passado, provavelmente mudaria algumas coisas, mas acredite: aos poucos você retornaria ao seu padrão natural de escolhas, seguindo seu instinto imutável.

Mas a questão é que vivemos exercitando nossas escolhas. Vivendo pedindo opiniões alheias, que muitas vezes são ouvidas apenas por desencargo de consciência. Você ouve só para reafirmar o que não irá fazer, com um espelho que mostra a ação contrária. Não interessa a imagem refletida, interessa sempre a origem real do reflexo. O que nos angustia, no entanto, é constante convenção social que nos leva a contrariar nossas escolhas, aprisionando nossas atitudes naturais.

Claro, a sociedade precisa de limites e de regras para garantir a sobrevivência, mas as escolhas de que falo não nos tornam mais violentos, menos éticos ou mais inescrupulosos. Falo de escolhas que nos fazem mais felizes e verdadeiros, sem invadir ou desrespeitar o limite do próximo. Escolher a profissão certa, amar a pessoa naturalmente escolhida, falar a verdade mesmo que seja dura, permanecer sozinho porque você se basta, viajar e nunca mais voltar, acreditar no que realmente o conforta, escolher os amigos que lhe convém, ser que você sempre foi por dentro. Coisas assim te libertam e fazem com que tenhamos argumentos espontâneos para nossas escolhas.


18/11/2010

Às Mulheres

Mulheres, meninas, garotas.
(Se você é homem, este não é um post para você. Pare agora.)
Tenho certeza de que não sou a única que de vez em quando precisa relembrar alguns velhos mandamentos para manter a situação sob controle. Certo? Trombei com um livro durante uma viagem – devorei em pouco mais de 2 horas porque andava mesmo precisando de uma sacudida. Também cheguei à conclusão que devo compartilhar isso com vocês, especialmente as solteiras (uma vez que desaprendi há meses como é ser uma pessoa casada). Vou listar aqui alguns princípios básicos. Minha idéia é: espalhem para todas as mulheres que conhecem, preguem em seus espelhos, na mesa do trabalho, coloquem alertas no celular. Façam o que for preciso. É um processo de desintoxicação.

A mulher com presença de espírito também sabe a hora de bater em retirada. Seja um “desafio mental” para seu parceiro, e não uma mulher carente. Em primeiro lugar estão os seus desejos (às vezes negociáveis), ao invés de sempre responder às expectativas externas. Recuar também é algo que os homens fazem para se sentirem mais seguros. Mas se ele não pode prever sua reação, você passa a representar um desafio mental.

Se você perceber que está sendo modesta, humilde ou qualquer delírio similar, corrija o problema imediatamente. Você é um bom partido, não tem que convencer ninguém disso. Dedique-se, seja companheira, mas não exagere demais (vale para as casadas). Não se afaste dos amigos, não abra mão da carreira e nem de seus passatempos prediletos. Foi por isso que ele se aproximou de você.

Seja independente, não conte tudo sobre você e não corra atrás dele. Os homens são estimulados pela ausência. Não perca o senso de humor. Cuide da sua saúde. Homens se divertem com o percurso para chegar ao destino. Controle sua vontade. Não se dê ao trabalho de se explicar quando um homem lhe falta ao respeito. Não se encontre com ele só porque ele quer. Você é quem deve querer. Não desmarque seus compromissos porque ele ressurgiu em cima da hora.

Você também pode “não querer nada sério demais agora”. Os homens não escolhem se apaixonar. Acontece sem querer. Mulher também!!! Declare suas preferências, você não tem que gostar de tudo que ele gosta. Mas é claro que um homem não quer uma mulher que o domine... Cuidado, feministas! Mantenha a relação platônica pelo menos no primeiro mês. Vai ser difícil, eu sei. Eles gostam de saber que os outros não conseguem chegar facilmente aonde ele deseja se estabelecer. Claro, a não ser que você também não queira nada além.

Não fique com medo de o homem desistir e desaparecer. O problema é dele! Se ele fala muito de si mesmo, é porque gosta de você e sente confiança. Mas você não é mãe, tia, irmã e nem apenas uma amiga. Você não tem que ouvir sobre a ex. Não finja um orgasmo. Ele vai saber. Você só satisfaz o outro quando primeiro satisfaz a si mesma. Concentre-se nisso. Você pode se sentir insegura, mas jamais demonstre isso. Se ele troca posts com outras no Facebook, não vigie o perfil dele. Além do mais, você também troca posts com pessoas que não têm interesse emocional, certo?

Deixe-o abrir a lata de palmito, comprar comida, lavar a louça. O homem precisa salvar “sua própria honra”. Cuidado com o homem que elogia a liberação feminina – ele está prestes a largar o emprego! Não se encontre novamente com um cara que no primeiro encontro aceita dividir a conta do restaurante. Não saia mais com ele!

O limite masculino para concentração em assuntos sentimentais é de 2 minutos. Nunca se abra sobre o que sente antes dele, seja amor ou ódio. Seja objetiva. Não peça permissão pra mudar de assunto – mude, se te incomoda. Diga algumas verdades em tom de brincadeira. Mas não conte de sua enxaqueca. Não conte a ele o que você era na vida passada e nem o que pretende ser na próxima encarnação (hahahaha eu ri muito dessa parte).

Só faça o que a deixa confortável. Constantes concessões não são saudáveis. Um pouco de silêncio ou distância podem resolver um problema. Espere... Recuar de maneira sutil, sem chiliques, pode ser muito eficiente. “Flutue como uma borboleta, ferroe como uma abelha.” Orgulho e dignidade. Bloqueie a dor e a raiva se precisar discutir. Todos gostam de pessoas que pensam antes de falar. Você não precisa seguir a moda e nem os conselhos das novelas. Você não precisa obrigatoriamente se casar para estar num relacionamento.

Os homens temem ser rejeitados pelas mulheres, por isso eles se mantêm na defensiva e muitas vezes demoram muito a ligar, retardam o próximo contato, esperam o destino dar um empurrão para não se sentirem expostos ao “fora”. Eles também não querem dar a impressão de que são ansiosos.

Só permaneça num relacionamento por sua própria vontade. Vá embora se não receber o que deseja. Mas se for bom, elogie. Moderadamente... Repito: os homens reagem à falta de contato. Paciência é um poder. Não desperdice seu tempo com pessoas negativas. Seja gentil e exija gentileza. Vale para qualquer pessoa em sua vida, claro.

Trechos extraídos do livro “Por que os Homens gostam de Mulheres poderosas”, de Sherry Argov.

16/11/2010

Redescobrindo...

Eu tenho um pé na Bahia. Aliás, só não tenho os dois pés lá porque ainda me resta um pingo de juízo. Pingo mínimo, por sinal – com chances eminentes de evaporação. A verdade é que aquela água quente, todo aquele calor espontâneo e todas as possibilidades naturalmente dispostas ao meu alcance me fazem muito bem. Bem que contamina cada poro do meu corpo, todos os meus neurônios ansiosos.


Afinal, por mais que tenhamos perdido várias horas no deslocamento, por mais que estivesse muito nublado quando chegamos ao entardecer, a Bahia sempre nos recebe carinhosamente. Gosto daquela terra de graça e mesmo o céu colorido do Rio Buranhem se revela como uma cerimônia de recepção a todos aqueles que, como eu, buscam um refúgio. Atravessamos de Porto Seguro, nosso ponto de chegada, até Arraial D´Ajuda, trajeto esse já bem conhecido por muitos brasileiros. Não avistei o Monte Pascoal, como outrora avistaram em nossas terras desconhecidas.


Andar pelo vilarejo à noite, especialmente fora de grandes temporadas, é uma oportunidade excelente de observar a cultura enraizada em cada detalhe. Seja uma influência européia, indígena ou africana, em Arraial nos certificamos que somos frutos de uma mistura inesperada, porém inquestionavelmente rica e poderosa. Na Rua Mucugê você encontra restaurantes de todo o tipo, pois Arraial também viveu um segundo descobrimento graças ao turismo – fomos invadidos! Não se assuste com a variedade de sotaques aportuguesados de argentinos, espanhóis, franceses, etc. Você descobre que está numa miniatura do mundo, viajando a cada 10 metros por realidades diferentes. Se quiser uma boa comida a quilo, procure pelo restaurante “Portinha”, no centro e próximo ao supermercado Cambuí. Se quiser uma moqueca bem em conta e farta, procure o restaurante Caminho da Praia, entre a Mucugê e a rua da igreja. Mas se quiser variar todos os dias, garanto que terá mais de um mês em opções para comer, de crepes e comida japonesa ou chorizo argentino... Encontre também a loja Terima Kasih, com artesanato oriental. Acredite, os preços de lá valem muito a pena, não se assuste com a imponência da loja. Entre, divirta-se e reze pra não enlouquecer. Se você gosta de todo tipo de artesanato (do indiano ao chinês), vai entrar em pânico. Se procurar bem, vai achar peças mais baratas do que os artesanatos locais na rua da igreja. Quando entrar na loja, você vai se lembrar de mim. Repare bem nos lagos com plantas ornamentais (incluindo vitória régia)... Ali cometi um crime ambiental que permitirá a reprodução de guppys baianos com guppys mineiros nascidos no meu apartamento... Não resisti! E todos sobrevivemos ao raio X do aeroporto, com direito a aquário novo para os 12 moradores “imigrados”.


A chuva não deu trégua no dia seguinte. Eis mais um “porém” sobre a Bahia: se não quer errar quanto ao clima, garanta-se em setembro e outubro. Nos demais meses você estará à mercê de um verão quente e úmido, é um risco. Mas acredite: até a chuva pode ser providencial. Topamos um passeio de quadriciclo rumo à praia do Taípe, encarando uma trilha tortuosa durante toda a manhã. Buracos, barro, água, chuva, pedras, pinguelas e marimbondos. Claro, sou a única pessoa que no primeiro dia consegue 5 picadas na cabeça por debaixo do capacete e uma nas costas, graças à minha sutil característica de sempre me meter em improbabilidades. Lembrando que não sei dirigir e que fui picada enquanto dirigia... Enfim, criei coragem e ainda não sei como não caí em nenhum momento, especialmente na pinguela cujo espaço era o exato para o quadriciclo se equilibrar. Tenho um carma com desastres, como já sabem... Mas sobrevivi e no final já estava zuando com a troca de marchas e correndo feito uma louca com minha mãe na garupa (ela se especializou em correr nas retas esburacadas).


O sol ressurgiu na manhã seguinte e aproveitamos para conhecer a Praia do Espelho, uma das mais bonitas do Brasil. Se alguém duvida disso, deve chegar à praia (que demanda um tempo na estrada) e se informar sobre o mirante “clandestino”. Vá antes que a maré o prenda entre as praias do Espelho e Curuípe. Surpreenda-se com uma visão maravilhosa, onde o horizonte se encontra com a Ponta do Corumbau (onde estive no ano passado). Enquanto esperava os nossos guias resgatarem minha mãe perdida ao tentar subir sozinha no mirante, decretei o direito de permanecer muda, estupefata com tantos tons de azul, lilás e verde num único e indivisível mar. Nas águas você sente as correntes frias e quentes alternando, confirmando os milagres da natureza. Ali eu também encontrei uma paisagem única, registrada em uma foto, onde o mar verde se contrapõe a uma nuvem densa, descolada do céu. Uma embarcação simples, ancorada, se intromete no cenário. Caminhe rumo ao rio Espelho, vai ter uma bela surpresa. Os preços são salgados, não se assuste.


À noite, um pulo na Ilha dos Aquários, ambiente típico de grandes festas durante a alta temporada. Mas como o próprio nome já diz, meu objetivo era outro. São 5 ambientes diversificados, de boate a solo de bossa nova, mas só queria mesmo era conhecer os tais aquários. Eram 6, com peixes imponentes, baiacus, arraias, enguias verdes e tubarões lixa. Paguei caro por pouco tempo apenas conhecendo os aquários, mas era só isso que eu realmente queria. Não viajei pra badalar, mas sim pra me dar uma folga das convenções sociais. E com direito a foto sendo carregada por um pirata...


Diariamente confirmávamos a direção do vento para programarmos os mergulhos e o pulo de parapente. Já antecipo que mais uma vez o parapente ficou para uma outra oportunidade. As terminas não atenderam aos nossos pedidos e perdemos a oportunidade de saltar das falésias da praia de Pitinga. Mas agendei o mergulho e navegamos com o mar batendo muito. Mas como diria o comandante, acho que sou mesmo do mar, pois não havia enjôo mesmo enquanto eu estava na proa encarando as ondas e a água revirada. Claro, nem todos têm essa mesma sorte. Desci rumo à minha promessa anual, mas o mar revirado me passou um trote. Vi mais areia do que todo o resto que o mar esconde. Vi pouco do que eu esperava ver, ou melhor, do que sempre espero ver a cada batismo (afinal, sou mesmo cara de pau e não fiz até hoje um curso digno como mergulhadora autônoma). À tarde, me contentei com as ondas da praia do Apaga Fogo, no quintal da nossa pousada.


Trancoso... Fácil de chegar, não se prenda aos guias turísticos. Apenas se informe sobre os horários em que as vans vão e voltam, especialmente aos domingos, cujo horário de transporte é reduzido. Conheça o Quadrado, resista às lojas e boutiques. O melhor mesmo é a vista da praia dos Nativos e dos Coqueiros. Se tiver tempo, ande pelas duas. Passamos o dia na praia dos Coqueiros, incluindo visões da prática de “kitesurf”. Afinal, o vento do parapente não chegou, mas era suficiente para esta modalidade... Que raiva! A praia é linda, principalmente se você topar andar pra bem longe das barracas... Caminhe rumo ao sul, rumo a Corumbau, e encontre praias com ondas boas para o surf. Um aviso: é uma praia cheia de corais e pedras, portanto, graças ao meu carma, não curti tanto o mar para me prevenir de alguns acidentes. Delicie-se com um belo peixe vermelho, típico da região. Os preços são bem parecidos com os das barracas em Arraial. Antes de partir, separe um tempo para curtir os mangues da região.


Por que tudo que é bom dura pouco? Além disso, como eu poderia ir embora tão contrariada com meu mergulho? Precisava das bênçãos do mar e por isso embarquei de novo, dessa vez no Miss Aritta, sem minha mãe e já conhecida da tripulação. O mar batia bem menos a caminho dos Recifes de Fora. Eu me sentia velha conhecida da equipe de mergulho, sendo confundida pelos demais turistas como membro da equipe porque eu vestia a camisa da operadora. Caí na água por último, com direito a mais um tempo submersa. Lagostas, frades azuis e cinzas, cirurgiões, donzelinhas, corais e um mero! Finalmente satisfeita, sentimento de promessa cumprida. Perdoei o primeiro mergulho e aliviei a tensão de ir embora para casa sem de fato me reencontrar.


Já dizia o gênio: uma mente que se abre nunca mais retorna ao tamanho inicial. A cada viagem volto mais rebelde, mais inquieta, com mais vontade de estar em todos os lugares ao mesmo tempo. Não sou onipresente, caro amigo baiano... Mas tenho uma bela vocação!


09/11/2010

Viaje, mas volte

Viaje, mas volte.

Viaje carregando tudo de que se lembra naturalmente, mas volte esquecendo tudo de que não precisa para seguir adiante. Viaje carregando tudo que lhe é vital, mas volte trazendo tudo aquilo que jamais sonhava conhecer. Viaje com seus medos e incertezas, mas volte com problemas de memória, como se recomeçasse a cada dia. Viaje pro mundo lá fora e também para dentro de si, mas volte entendendo como o mundo é bem maior do que as limitações cotidianas. Viaje para lugares que te surpreendam, mas sempre volte para seu porto seguro sem arrependimentos.

Pois não há viagem que não te modifique, não há ida que não te faça revirar a alma antes da volta. Permitir-se ser moldado pelo mundo, flexivelmente como a argila, dói bem menos do que manter-se como o recife contra o mar. A mudança virá, permita você ou não. Afinal, deslocar-se no espaço é quase tão eficiente quanto o tempo para curar e renovar. Qualquer rota tomada vai de encontro a si mesmo, resgatando o foco, a segurança e a coragem. Viaje, reencontre-se.





01/11/2010

Freud disse...


“No inconsciente, não existe o conceito de tempo, de certo e errado e não há contradição.” Eis que me falta um certo período inconsciente, quase inconsequente. Dói ser tão impulsiva, assusta não ter paciência pra esperar que tudo ocorra de forma natural. Mas me sinto aliviada quando cuspo meus marimbondos e saio atropelando tudo que me cerca. Eis o problema: talvez eu seja movida a adrenalina e nenhum outro jeito de ser realmente me sustente.

Gosto de tudo bem planejado, esclarecido, transparente. Por isso falo na cara, por isso aparento tamanha coragem, no limite da loucura. Cara de pau, para ser mais precisa. A questão é que não suporto a idéia de perder tempo com joguinhos, com frescuras e convenções sociais, com a guerra de egos que o mundo inteiro simula e dissimula. Não dá pra mudar, se não vejo isso como uma atitude indevida. Volto ao inconsciente, onde não há esse julgamento...

Sim, aí também mora a contradição... Se gosto de fazer planos, como posso ser espontânea e assumir iniciativas malucas, quase suicidas? A questão é que ter um cenário e personagens é fundamental à construção de castelos imaginários, que se confundem constantemente com meus planos mirabolantes. Sim, hoje quero me casar com um príncipe, mas me basta acordar amanhã do mesmo jeito que estou hoje. Sim, quero rodar o mundo sozinha, sem rumo, mas vale também se eu ainda acordar na minha cama e no dia seguinte estiver na Bahia. Eis que a contradição pode se sustentar por um dia, ou um pouco mais, pois não ameaça a essência.

30/10/2010

Ação e Reação

Destinos se conectam apesar das improbabilidades. Algo em mim atrai histórias de pessoas muito diferentes que normalmente me fazem refletir sobre minha própria história. Fato é que as grandes mudanças no meu jeito de ser sempre ocorreram em momentos de grande luta e dor. Porém, o que nos define nestes tempos de medo é a forma como reagimos ao que nos espera adiante. Ou seja, você é a medida proporcional à luta travada para superar o que o aterroriza. Você age e reage a cada respiração.

Quanto topo com alguém que viveu, sofreu ou perdeu algo semelhante ao meu trajeto, descubro que estou bem melhor do que a maioria das pessoas que passam por certas situações: seja uma doença, seja uma separação, ou qualquer outra coisa que te deixa completamente sem chão. Sem dúvida esses dois momentos permitiram uma mudança para melhor e me definiram como que hoje sou. Descobri que brigar pode ser necessário, que uma dose de egoísmo é fundamental pra não se tornar um fantoche emocionalmente dependente, que a esperança é a única coisa que te faz acordar no dia seguinte. E que o tempo cura tudo.

Ainda tenho vários defeitos. Sou mimada, teimosa, ansiosa. Basicamente três características que me fazem buscar as atenções de quem amo, bater o pé pelo que acho certo e não enxergar a realidade, viver esperando por uma vida constantemente cheia de grandes feitos e descobertas, criar expectativas sobre o que não existe. A verdade é que preciso entender que 70% da minha vida será sempre “pacata”, contrapondo-se a todas as loucuras que já fiz e ainda farei. Entretanto, penso: por que insisto em achar que essa condição é “errada”? O que me inquieta é a sensação de que estou desperdiçando meu tempo, ou melhor, que a morte será um desperdício.

Hoje, como estou, como vivo, como me projeto, é o melhor que posso fazer. Isso deveria me bastar, acalmar minhas inconstâncias, suprir meus desejos. Aceitar que faço o que posso. Porém, bem lá no fundo da alma, eu tinha outros planos para mim, completamente inviáveis por sinal. Mas apesar das impossibilidades, esses planos ainda insistem em me mover adiante, chegando o mais próximo das metas criadas quando eu ainda era criança. Eis a diferença entre estar feliz onde se está e o que você faria se tudo fosse possível. O grande lance é estar o mais feliz possível onde se está e deixar que as ambições te propulsionem sem pressão.

Tudo isso estalou como um estrondo em meus pensamentos nessa madrugada. Como se caísse uma ficha de 5 toneladas. Não adianta buscar os motivos que acreditamos serem as causas de tudo que aconteceu, especialmente quando uma segunda pessoa está envolvida. Se essa pessoa não te disser o que sente ou o que a faz agir daquela maneira, não adianta tentar montar um quebra-cabeça pra entender o que se passa dentro do coração do outro. Nenhuma justificativa irá mudar o curso das coisas e o alívio será temporário, exatamente porque não traz uma solução.

Neste quesito sinto que vou sofrer eternamente. Queria que as pessoas fossem mais transparentes, mais sinceras com o que querem de fato, tanto de mim quanto do mundo. E aí esse meu jeito de arrotar tudo que incomoda, de falar o que realmente quero, até que ponto quero, acaba assustando boa parte das pessoas que ainda não me conhecem. Não consigo segurar dentro de mim nenhum tipo de sentimento, seja de carinho, seja de raiva, seja de tristeza. Se não gosto de uma pessoa (o que é bem raro), garanto que ela sabe. Não sou política com quem "insuporto". Mais um motivo para meu sorriso frouxo e quase constante bom humor parecerem algum tipo de proteção ou até falsidade. A questão é que não sei mentir sobre como estou me sentindo e a minha sorte é que apesar das tensões, decepções ou dúvidas, normalmente faço piadas e me sinto realmente alegre, independente dos meus medos. Sofro intensamente, mas passa naturalmente.

Obs: Nunca saio em fotos quando não me sinto feliz.

19/10/2010

Assombre-se

Ao me deparar com as imprevisibilidades da vida, com os assombros rotineiros, com as farsas mirabolantes, com as descobertas improváveis - respiro sustos. Possibilitar sinapses inesperadas, arregalar as pupilas, permitir-se ficar boquiaberto, transpirar adrenalina ou simplesmente descobrir-se inebriado por mistérios intangíveis.

Diariamente me flagro em questionamentos quase ilógicos considerando a velocidade do mundo moderno. Não há tempo para duvidar do que não se vê, do que só se prova em fórmulas matemáticas ou simulações das leis da física. Manter-se continuamente surpreso com cada mudança no rumo das coisas é o que nos distingue daquilo que não tem vida, é o que torna você um animal pensante. Tão pensante que destrói na mesma velocidade com a qual cria e recria.

Estou falando de coisas que gerações anteriores à minha jamais sonhariam um dia conhecer, que eu sequer imaginaria nos meus ingênuos tempos de criança fantasiosa. Afinal, quem imaginaria que nos tornaríamos bípedes e que neste milênio teríamos planos de pousos em Marte? Quantos ainda não duvidam que pisamos na Lua? Qual a distância real entre a nossa inteligência e toda a concretização de sonhos que nos foi possível, surpreendendo até mesmo as probabilidades da evolução das espécies? Darwin não seria tão inventivo!

Ridiculamente ainda me pego questionando como consigo enviar informações via “wireless”. Se não há um meio visível, um veículo palpável, como as palavras que aqui estou postando chegam aos seus olhos, onde quer que você esteja? Como é possível falar quase em tempo real mesmo estando em países quase opostos nessa Pangéia maluca? Como você me ouve falando num telefone celular se não posso tocar nestas ondas transmitidas aleatoriamente pelo espaço que me rodeia? O quanto do que falo não está ainda disperso no meio, o quanto do que falei pode ser recuperado em ondas que ainda flutuam? Vai me dizer que você entende o som, a luz e todos somos emaranhados de células?

Estupidamente tropeço em meus pensamentos quase ignorantes, ainda questionando coisas como: fotografia, televisão, e-mails, webcam, sistema imunológico, meiose e mitose. Como se eu fosse uma alienígena no meu próprio mundo, sem acreditar que todas aquelas leis malucas da física realmente fazem algum sentido e mais – sem acreditar que ainda estamos longe do esgotamento do conhecimento disponível lá fora. Como posso assimilar tanta mudança, tantas coisas antes impensadas, sem ao menos duvidar do que de fato é realidade ou ficção?

Espero pelo tele-transporte, aguardo ansiosamente pelas estações espaciais, torço diariamente pela cura do câncer, sonho com a descoberta do centro da Terra. Tenho medo de robôs, me apavoro quando imagino o poder da telepatia, fico apavorada com a globalização que transforma todas as sociedades numa rede viciada e dependente. Quando o mundo vai se esgotar? Tudo aquilo que sequer ouvir falar ainda irá chegar aos meus olhos ou aos olhos daqueles que me sucederem. Coisas que escapam à minha humilde imaginação, pois talvez me baste cruzar os dedos para que um dia consigamos entender o que os golfinhos estão dizendo o tempo todo. Lucro seria entender a própria inconstância do ser humano!


Em homenagem aos velhos papos na "República das Toscas"...

17/10/2010

Vida Alienígena

Há muito tempo não me espantava com a descoberta de um novo tipo de vida. Fico sempre esperando por este tipo de notícia, sempre acreditando que grandes formas de vida ainda estão para ser desvendadas. Não, não estou falando de vida em algum ponto do espaço (não que eu duvide, obviamente). Estou falando sobre me espantar com uma novidade aqui mesmo, nesta Terra infindável.

Não estou falando de peixes que andam pelas águas, nem sobre animais que parecem aberrações, muito menos sobre formas de vida fluorescentes em uma longínqua região abissal. Estou falando sobre um ser que saltou de histórias fantásticas, como se concretizasse contos de fadas. Um unicórnio do mar, como muitos o conhecem. Mas ao meu ver, trata-se de um beija-flor das águas.


“O narval é um cetáceo de grande porte, com 4 a 5 metros de comprimento e cerca de 1,5 toneladas de peso. Tem uma coloração branca e cinza marmórea e é desprovido de barbatana dorsal.” O que parece um bico de um beija-flor ou um chifre de unicórnio na verdade é a manifestação do dimorfismo sexual na espécie. Manifesta-se no dente incisivo superior esquerdo dos machos, que se encontra enrolado em espiral e que se projeta realmente como um chifre. Este dente é feito de marfim e pode atingir até 3 metros, quase de metade do comprimento do animal. A presa do macho do narval é fonte de marfim - com valor comercial se constitui num atrativo à caça da espécie. Cerca de um macho em 500 tem duas presas pontuadas, e não apenas uma.

Este dente possui milhões de terminações nervosas que garantem a sobrevivência deste animal em seu habitat, em meio ao gelo ártico, orientando-o em suas migrações sazonais em busca de alimento. A pesca atualmente do narval hoje é controlada, o que ainda parece absurdo, uma vez que são apenas 50 mil indivíduos atualmente espalhados pela região. Foram amplamente caçados pelos vinkings, especialmente graças ao seu suposto chifre, uma vez que era negociado como um chifre de um unicórnio. Não estamos falando apenas de uma espécie ameaçada de extinção, mas provavelmente com mínimas chances de futuro.

Sabemos tão pouco sobre o narval e tantas outras formas de vida... Insistimos em enxergar tudo com os olhos da história, sempre focados na evolução da vida na Terra, criando museus e espalhando paleontólogos pelo mundo, enquanto o planeta se mostra como o melhor laboratório existente. Hoje nasceram mais 3 filhotes no meu aquário, mínimo ecossistema diante das possibilidades desse laboratório disponível ao meu redor. Mas não deixei de me assustar com as possibilidades que existem lá fora...

Beluga, mais uma figura das águas geladas...

Você já tinha visto uma Baleia da Groelândia?

14/10/2010

Sobre o Perdão

Perdoar é mais difícil do que simplesmente soletrar ou recomendar esta atitude. Perdoar vai de encontro ao entendimento, à análise das causas e efeitos, à compreensão do destino talvez inevitável. Chegar à compaixão – eis o auge do poder do perdão. Claro, leva muito tempo. Mas é importante torcer para que este tempo finalmente o encontre e o liberte. Libertar, porém, não é esquecer. É simplesmente aceitar, deixar de lado e seguir em frente.

Hoje vejo tudo com olhos mais serenos, apesar dos resquícios saudosistas inconformados. Hoje sinto que tudo encontrou seu eixo, voltei aos meus planos iniciais e provavelmente fundamentais à minha felicidade. Mas realmente demorei muito a aceitar um rumo que não planejei. Só aceitei quando notei que aquele mesmo rumo eu nem sequer tinha planejado para mim e que o início de tudo caiu no meu colo, assim como o final da história também despencou na minha cabeça. Eis que surge o lucro, pois nem sequer esperava viver algo assim – mesmo que intenso por pouco tempo.

Hoje acredito que o sofrimento foi curto o suficiente para me transformar e doloroso o necessário para me amadurecer. Não é fácil entender os rumos que a vida toma, mas nadar contra a maré apenas desgasta seus músculos e esgota sua energia. Há alguns meses eu não estaria tão em paz com tudo isso, mas cada vez mais sei que fiz o que pude e que tudo tende a se tornar cada vez mais claro e distante.

Hoje penso que o certo foi ir embora o mais rápido possível, antes que tudo se tornasse ainda mais difícil e decepcionante. Ainda não evolui ao ponto de sentir empatia, mas aos poucos me liberto da mágoa que me consumia. Afinal, foi tudo perfeito durante 98% do tempo, restando ressentimentos a poucos dias de toda uma convivência. Hoje acredito que o certo é ir embora – bem melhor do que enganar e continuar se enganando.

As despedidas raramente deixam boas lembranças, mesmo que não exista rancor e só permaneça a saudade. Mais difícil ainda é se despedir de todo um plano de vida, mesmo aquele inesperadamente construído. Mas eu descobri que a vida não se encontra em apenas um plano, mas sim em múltiplos caminhos continuamente dispostos à nossa frente. Somos feitos de universos paralelos e mesmo que você não aceite um caminho, a não aceitação por si só é uma escolha.


06/10/2010

Ganância é bom?

Eis o mote de Gordan Gekko quando precisa retornar ao palco financeiro ao sair da prisão. Uma vida atribulada pela ganância e um plano que se descortina como um lobo em pele de cordeiro. Emblematicamente simbolizado pelo conflito família e ambição, Gekko aos poucos evidencia suas táticas de manipulação de um jovem ainda ingênuo diante de tantos touros em Wall Street. Tudo se trata de retomar sua influência sobre o mercado e assim ditar os destinos de milhares de pessoas.

Não entendo nada sobre mercado de ações, jamais seria responsável pelo dinheiro investido por gente que sequer conheço. Nem seria responsável por aplicar o dinheiro de quem eu conheço! Não sei como tantos sobrevivem num mundo de especulação, nebuloso e incerto. Afinal, o que vale é aposta e não necessariamente o que se ganha. Não importa se você aposta em nome de um injusto vencedor, o que vale é a coragem de arriscar.

Mas não posso negar que todos temos essa ponta de ambição encravada em nossos maus hábitos de compra, em nossas escassas poupanças, em nossos pensamentos comumente feitos a curto prazo. O amanhã parece caro demais para merecer um seguro. Vale a pena arriscar agora por uma dose de prazer finita, mesmo que depois se arrependa. Afinal, quem garante que estaremos aqui no dia seguinte? Por que é que precisamos pensar nos nossos herdeiros, no futuro do planeta ou nos impactos sociais causados por uma explosão de touros obcecados? Ora!

Sou tão fraca quanto todos, e diariamente vejo isso. Conheço minhas fraquezas, apesar de ainda não saber controlá-las. Mas a dimensão do meu pecado capital ainda se restringe ao meu mundinho, sem prejudicar ninguém, sem ser desonesta. Trata-se de uma falta de oportunidade de ser mais gananciosa? Espero que não. Essa "ingênua ambição" não acontece nas loucas bolsas de valores, nem nas negociações entre governos que jamais tomaremos conhecimento, muito menos nas conspirações arquitetadas durante anos por 5% da população mundial que detém 80% das riquezas do mundo especulado. Bildeberg e qualquer outra que já conheça através de rumores malucos...

Nossa sociedade é feita de ciclos – a história insiste em nos dar a mesma lição constantemente. De 1929 à crise de 2008, estaremos sempre à mercê das bolhas econômicas, pois faz parte do ser humano criar novas esperanças e valores, o que também inclui a supervalorização de alguns itens em nome do prestígio, poder e lucro. Hoje o petróleo dita regras, mas não se trata de uma fonte renovável. Sustentabilidade - entenda de uma vez por todas que essa é a próxima bolha... E assim como a sociedade, também somos feitos de ciclos, pois nada é permanente neste mundo globalizado. Você é só mais uma engrenagem. Afinal, quem disse que a empresa em que você trabalha também não faz parte de uma grande bolha?

30/09/2010

Controlar!!!

Sou de um signo onde significante e significado estão em conflito. Significante este que transparece temperança, como se eu fosse tão sóbria quanto é necessário a uma vida moderada e comedida. Significado que bem lá no fundo me conceitua pelo paradoxo entre o vício da inveja e a intuição conjugada pela eterna neurose da análise. Tratando tudo isso como se fosse um serviço apalpando uma espiritualidade ainda desconfiada.

Sou intestino puro, digerindo tudo ao mesmo tempo e normalmente com dificuldade para absorver aquilo que para mim não é natural e óbvio. Eis o motivo de tanta inconstância no amor! Se não há estabilidade e uma certa previsibilidade, não me organizo, não encontro meu centro. E por isso me dou bem às quartas-feiras – afinal, estão bem no meio da semana.

Carregando um estereótipo fleumático, ainda assim conto com a sorte. Até tenho uma amiga com o nome de Trevo, aquela planta-flor verde que simboliza uma boa “vibe” a caminho ou que teoricamente atrai bons momentos. Meticulosa até pra me cercar de qualquer possibilidade sobrenatural que possa favorecer os resultados esperados. Afinal, não basta deduzir, apesar de este ser um hábito diário em tudo que faço.

Aqui estão minhas qualidades e defeitos, todos girando em torno de uma ansiedade quase genética. Eis o motivo da minha necessidade de controle neste momento: organização é meu lazer. Planos me movem continuamente. Não há possibilidades aos meus olhos se não encontro o caminho a percorrer. Simplesmente seguir, no modo automático, não me satisfaz.

29/09/2010

Corrente em Esmeraldas

Cenas de um domingo diferente...
Olhando pra um mundo diferente...

Com muitos voluntários dispostos a ajudar!

E brinquedos pra tornar o dia inesquecível...

Afinal, esse sorriso é uma benção!

Assim nos lembraremos de que não estamos sozinhos no mundo...

Afinal, os amigos estão sempre ao nosso lado!

27/09/2010

Choveu

A chuva demorou a chegar. Normalmente a chuva aparece no dia do meu aniversário, ou poucos dias depois, isto é, mais de um mês antes de hoje. Estamos na primavera, mas aprendi a me despedir do inverno com algumas gotas de chuva. Era o sinal de que todo o mau tempo, seco e duro, havia passado.

Eis uma explicação climática para dias tão turbulentos. Nunca vivi um mês de setembro tão duro, tão dolorido e ácido. Demorou a chover! Sem água, não dá pra amolecer. Não há pedra que se molde sem força ou sem constância. Já sei há um bom tempo que, no meu caso, só a constância dá um jeito nas coisas.

Não consigo dizer o que me atinge, ou talvez eu saiba: é o simples fato de não saber O QUE me angustia. Porque dói, mesmo que eu não consiga dizer aonde, nem como, nem a origem. Não ter controle sobre esse medo que não pára é como entrar numa onda de pânico, como se tudo estivesse no lugar errado.

Mas só hoje a chuva chegou, fina e sutil, amaciando a terra dura, abaixando toda essa poeira. Espero que esse seja o sinal de que finalmente vou conseguir me “desligar”, me permitir de novo a leveza, uma certa falta de compromisso, uma inconseqüência corajosa. E quem sabe, quando a chuva finalmente penetrar a profundidade necessária, a terra há de se tornar fértil de novo, propícia aos novos planos, solidária aos meus medos constantes.

23/09/2010

Desligando...

Estou sentada no meu sofá. Fecho os olhos e tento ouvir só o mundo lá fora. Como é difícil ordenar os pensamentos! Esvaziar a mente é impossível! Tento extrair somente as idéias que merecem estar ali, encravadas nas minhas sinapses. Mas todas as conexões histéricas permanecem chovendo canivete. Só queria uma mente leve, sem os últimos medos, sem os recentes pânicos. Queria segurança dentro de mim.

Claro, lutas internas são sempre batalhas mais cansativas e duradouras. Só se vence quando a idéia por si só desiste de aterrorizar, não há como tornar um ou outro exército repentinamente mais forte e eficaz. A idéia só se esvai com o bendito tempo, quando as coisas se resolvem por si mesmas, sem que nossas influências possam afetá-las. Quando a luta é contra o próprio pensamento, não existem vitórias que possam ser travadas do lado de fora...

Não basta reunir forças no que já fizemos de bom, na coragem que supostamente tivemos, nas nossas qualidades e muito menos no quanto somos amados (talvez até odiados). Tudo isso parece insignificante quando o que se sente é causado por uma simples falta de prazer, falta de sonhos, falta de querer. Quando não se pode atacar o problema, quando não há o que esperar, toda a falta de propósito cega, porque não sabemos aonde vamos chegar.

Andar, andar, andar, sem rumo, é coisa pra gente insana. E não consigo ser tão leve e desapegada ao ponto de esquecer que estou simplesmente perdendo um tremendo tempo. Falta alguma coisa. Mesmo que eu ainda não saiba o que é. Só sei que não é uma coisa que dependa de outra pessoa, é um buraco negro dentro do que eu mesma esperava ser. E quando se luta contra um mal invisível, que não aparece em exames médicos, que não se concretiza em falhas constantes, muito menos em choro constante, fica difícil convocar o exército certo.


22/09/2010

Desligar, controlar e retomar

Não se trata de uma decisão mal humorada, muito menos de uma onda qualquer. Trata-se da minha redoma, de me resguardar de todo o desgaste ao qual venho me expondo todos esses meses, talvez anos. “Aquele era o momento para eu procurar o tipo de cura e de paz que só podem vir da solidão.” Sou tipicamente atirada, falo pelos cotovelos e consigo me aproximar até daqueles que mais parecem jaulas. Mas hoje só quero a minha própria gaiola.

Venho sofrendo de um mal - velho conhecido. Sinto aquela “(...) a desoladora incapacidade de sustentar o contentamento.” Como se tudo fosse tão volátil e inflamável como álcool, sem deixar sequer vestígios da intensa alegria momentânea. E, convenhamos, isso deixa qualquer um decepcionado com sua própria capacidade de se manter auto-motivado, ativo, altivo, vivo.

“O que sei é o seguinte: estou exausta com as conseqüências cumulativas de uma vida de escolhas apressadas e paixões caóticas.” Escolhas feitas por pressão, outras pelo destino, outras por minha própria ansiedade. Não dá pra esconder de mim mesma como gostaria de ter aquele controle remoto que pula o que incomoda, o que pesa, o que desgasta. E colocar em câmera lenta aquilo que é bom e que nos completa verdadeiramente. O caos e a pressa me esgotaram, preciso de um tempo pra voltar a velha rotina de ser quem sou, ou talvez quem todos esperam que eu seja...

“Bhagavad Gita – aquele antigo texto iogue indiano – diz que é melhor viver o seu próprio destino de forma imperfeita do que viver a imitação da vida de outra pessoa com perfeição.” Entretanto todos podem julgar tudo isso como angustiante, ou como ingratidão, sem pensar na carga de responsabilidade que carrego todos os dias. Ser sempre a amiga presente, ser sempre a racional a quem recorrer, ser sempre a companheira de conversas frívolas ou profundas. Ser sempre o que o outro espera. Não consigo mais estar em tudo e com todos.

Claro que não consigo viver sozinha... “Mas sou inteiramente tragada pela pessoa que amo. Sou como uma membrana permeável. Se eu amo você, lhe dou tudo que tenho. (...) protegerei você de sua própria insegurança.” E lá vem o peso de novo! A culpa é toda minha, eu acho. Sempre estive aqui, o tempo todo, pra todo mundo. Fato é que também tive todos ao meu lado quando precisei, sem pestanejar, mas ainda preciso de um tempo na minha redoma, no meu castigo pessoal.

“Como a maior parte dos humanóides, carrego o fardo daquilo que os budistas chamam de ‘mente macaco’ – pensamentos que pulam de galho em galho.” Preciso organizar minhas idéias, aliviar a pressão, evitar que o coração aperte. E quanto mais absorvo do mundo lá fora, mais macaco me sinto. E estou cansada de pular de galho em galho. Não se trata de insatisfação, trata-se de uma viagem sozinha, rumo a um lugar que espera por mim, só por mim...

Preciso exercitar meu coração, endurecido arduamente nos últimos tempos. “A flexibilidade é tão essencial para a divindade quanto a disciplina.” Preciso vigiar meus vícios, minhas fraquezas, ao mesmo tempo que devo me permitir ser leve e desapegada. Talvez assim eu de fato aceite que tudo passa e “(...) que toda a tristeza e dificuldade deste mundo é causada por pessoas infelizes.”

As frases entre aspas são do livro de Elizabeth Gilbert.

11/09/2010

Onde

Não pertenço ao lugar em que estou agora. Essa minha súbita inércia poderia ter sido prevista, quando o que realmente me move vai além do que está ao meu redor. Sim, alcancei inúmeras conquistas, mas o que fazer com um espírito inquieto que não conhece satisfação plena e vive de pequenos vícios sem freio? Não se pode lutar contra sua essência, especialmente se você se obriga a prioridades que não nascem no seu sangue.

A sensação que tenho é de que por algum motivo estou perdendo um tempo enorme, afinal, o mundo é muito grande. Mas essa mania astrológica de ser planejada, realista e concreta me impede de fazer coisas que talvez realmente satisfizessem meu lado pisciano. Claro, o lado virginiano acha tudo um máximo. Mas e o mundo? Quem sou eu aqui, estática, congelada, entediada, sem planos a curto prazo? Longo prazo - o que é isso?

Não quero viver presa às mediocridades, tenho andado mais calada para talvez ser menos medíocre. Sim, sou uma boba falante, que espirra os sonhos pelos cotovelos. Trago pra mim a inveja alheia, acabo ouvindo opiniões desnecessárias. E por fim desabafo numa realidade também criada para ser meu esconderijo: mas, claro, não posso me esconder do mundo, ainda assim falo mais do que deveria.

Se eu pudesse me teletransportar, não estaria aqui e nem em algum lugar já conhecido. Estaria provavelmente em um cenário completamente estranho aos meus olhos, me permitindo a minha verdadeira vocação: a descoberta, a aventura. Afinal, eis o motivo do nome deste blog, motivo este que se desviou ao longo destes últimos meses onde tive que ser um pouco menos “eu”.

Não se assuste com essa vontade supostamente repentina de fugir, chutar o balde, perder a noção. Ela passa. Um dia passa. Não sei se (in)felizmente. Só sei que meu coração está inquieto porque sinto que cada vez mais estou presa às definições sociais e prioridades que não são naturalmente minhas, apesar de amplamente reconhecidas como cruciais à minha sobrevivência neste mundo capitalista. Eis que o que me dói não é não ter me transformado numa oceanógrafa, nem numa jornalista a correr o mundo. O que me dói é não saber pra onde vou em breve, muito menos se conseguirei um dia estar em todos os lugares com os quais tanto sonhei.

Ilha de Páscoa

06/09/2010

You Can't

You Can't Always Get What You Want
Rolling Stones
Composição: Keith Richards / Mick Jagger

You Can't Always Get What You Want
I saw her today at the reception
A glass of wine in her hand.
I knew she was gonna meet her connection,
At her feet was a footloose man.

And you can't always get what you want,
Honey, you can't always get what you want.
You can't always get what you want
But if you try sometimes, yeah,
You just might find you get what you need!

I went down to the demonstration
To get our fair share of abuse,
Singing, "We gonna vent our frustration."
If we don't we're gonna blow a fifty amp fuse.
So, I went to the Chelsea Drugstore
To get your prescription filled.
I was standing in line with my friend, Mr. Jimmy.
And man, did he look pretty ill.
We decided that we would have a soda,
My favorite flavour was cherry red.
I sing this song to my friend, Jimmy,
And he said one word to me and that was "dead."
And I said to him

And you can't always get what you want, honey.
You can't always get what you want.
You can't always get what you want.
But if you try sometimes, yeah,
You just might find you get what you need!

I saw her today at the reception.
In her glass was a bleeding man.
She was practiced at the art of deception;
I could tell by her blood-stained hands.

And you can't always get what you want, honey.
You can't always get what you want.
You can't always get what you want,
But if you try sometimes, yeah,
You just might find you get what you need!

And you can't always get what you want, honey,
You can't always get what you want,
You cant always get what you want,
But if you try sometimes, yeah,
You just might find you get what you need


A vida é assim...
Você não pode ter sempre o que quer
Querida, você não pode ter sempre o que quer
Você não pode ter sempre o que quer
Mas se você tentar às vezes, sim
Você vai encontrar o que precisa

01/09/2010

Pólos e Tango em Cores

Quisera eu conseguir expressar em palavras aquilo que só a arte é capaz de tornar corpóreo, palpável e visível aos olhos do coração. Certas imagens são indivisíveis do próprio conceito, portanto, como seria possível representar em palavras aquilo que só se sente com os olhos e coração? Da ópera ao teatro, do balé ao cinema, dos meus rabiscos aos escritos que realmente merecem atenção, todo tipo de representação artística nos torna mais humanos e em alguns momentos quase sobrenaturais.



Quando se trata do corpo, esquecemos dos limites que superamos continuamente: no palco, nas tarefas diárias, nos padrões de estética impostos pela sociedade, nos campos de concentração, nos campos minados de guerras civis, nas fronteiras esquecidas de um país. A força que nasce em músculos, percorrendo mentes e alcançando o que um dia foi impossível, sobrepondo leis da física e criando movimentos passíveis de reconhecimento: é um ímã, não parece o pouso de um pássaro, não são grilos ensaiados, não seria tango?




O que a dança nos permite transcende o fato de ver o outro se movimentar num ritmo inteligível. Não é apenas reconhecer novos limites do próprio corpo e da compreensão autorizada por uma nova leitura do que somos. Não somos apenas fisicamente fortes e capazes – somos dotados do poder de criação de formas de expressão sem limites, porém compreendidas independente de religião, classe social, política, sexo, raça, profissão. O que a dança permite é reconhecer-se, sempre de uma forma completamente diferente de quem está na poltrona ao seu lado.


Reconheci cores, fotografias, ritmos, gente que transforma objetos inanimados em ação. Enquanto outros reconheceram balé clássico ou moderno, movimentos que simbolizam a relação humana, tules, melodias e diferentes tipos de tango. Eis a beleza da arte: o seu olhar é sempre um novo resultado, sempre uma experiência única, particular e indivisível. A arte é sempre só sua, só minha.

Quisera eu entender todo tipo de arte na profundidade que ela de fato me permite. A questão é que para muitas artes serei leiga eternamente, pois nem tudo atinge meu entendimento e nem tudo me remexe da mesma forma que acontece com outros milhões de pessoas. O que me sacode não é necessariamente o que sacode você, e vice-versa. O que vale é treinar-se à percepção, nos transformando em seres mais humanos, menos ímãs, mais próximos da inconstância de um tango.

Imagens dos Espetáculos "Ímã" e "Lecuona" do Grupo Corpo.

Obs: Ju Mayrink, obrigada!

19/08/2010

Inhotim por Lispector

Aqui estou para citar Clarice onde senti arte. Quando ali estive pela primeira vez, defini uma seqüência de fatos. Não foi fácil voltar, pelo contrário. Um ritual de passagem, como os índios que colocam as mãos em cumbucas de vespas. Foi uma atitude para mudar a lembrança anterior. Aqueles jardins verdejantes, aqueles lagos que refletem nuvens, galerias que moldam qualquer ser humano ao adentrar por portas rotatórias sem fim. Passar por tudo isso de novo, criando um novo contexto.

E Clarice bem ali, sem notar. “Lispectoriando” todo o caminho, ao lado de bons amigos. Novas imagens, novas palavras. Aqui Clarice estará em parênteses, uma vez que suas citações são pertinentes aos meus sentimentos naquele lugar. “Sou sempre eu mesma, mas com certeza não serei a mesma pra sempre.” Todos estes dias Clarice mostrou que sabe mais de mim do que eu mesma.
Quem dera todos pudessem vivenciar cada percepção permitida por aquele lugar. O Inhotim (http://www.inhotim.org.br/) é mais do que um museu de arte contemporânea e um conjunto de belos jardins concretizados por Burle Marx. É sentir-se ser humano através de obras que permitem inúmeras leituras, ou até mesmo analfabetismos quando não nos identificamos com a realidade ali criada. “Renda-se, como eu me rendi. Mergulhe no que você não conhece como eu mergulhei. Não se preocupe em entender, viver ultrapassa qualquer entendimento.”

Entretanto, além do verde inebriante, nada se compara ao efeito que os sons têm sobre mim naquele lugar. As galerias que fazem meu coração parar são aquelas que escapam aos olhos. O que mais diz sobre mim ali não se expressa em nada concreto, mas é ondas invisíveis e ritmadas. Além do coral posicionado por timbres, uma a orquestra que ambienta o cenário de um filme de terror. Corvos assombrando meus temores mais íntimos, tornando-me mínima, frágil e insignificante. Eis que penso, feito Clarice: "Cuide-se como se você fosse de ouro, ponha-se você mesmo de vez em quando numa redoma e poupe-se." Olhos molhados, mas sem vazamentos perceptíveis.

“É curioso como não sei dizer quem sou. Quer dizer, sei-o bem, mas não posso dizer. Sobretudo tenho medo de dizer, porque no momento em que tento falar não só não exprimo o que sinto como o que sinto se transforma lentamente no que eu digo.” Se não fossem meus amigos, teria ali sucumbido às velhas lembranças, mas eis que assim é a vida: você pode reconstruir todo um mundo em segundos, desde que tente, se esforce e se permita. “Liberdade é pouco. O que eu desejo ainda não tem nome”.

O “inhotinhês” poderia mudar um mundo. Estranho ainda mais pensar que tanta beleza e grandiosidade se escondem, completamente deslocadas diante da realidade que ronda uma imensidão de expressões da diversidade humana. “Eu não sou promíscua. Mas sou caleidoscópica: fascinam-me as minhas mutações faiscantes que aqui caleidoscopicamente registro.” Enquanto a redoma de vidro espelhado esconde um trator fora de estrada carregando uma árvore de plástico, você se depara com a mesma obra fazendo parte de um cenário sobre orixás que horroriza, atordoa e leva a debates sobre o que realmente é arte. Eis que dou o braço a torcer para meu amigo: fato – a arte é relativa.

Mas... “Não quero ter a terrível limitação de quem vive apenas do que é passível de fazer sentido. Eu não: quero uma verdade inventada.” Talvez seja esse o grande desafio de criar arte, independente do conceito que norteie o desabafo humano. Pois a arte nada mais é do que uma forma de cuspir marimbondos, de eternizar idéias e ideais, de levar o outro a pensar - mesmo que jamais o conheça. É reduzir qualquer limitação geográfica que impeça um pensamento.

Afinal, quem não gostaria de ser eternizado, mesmo que não seja um artista, um escritor, uma pessoa incomum? O que sentimos quando notamos que nossos descendentes não perpetuarão nossas obras e vontades? O que sentimos ao pensar que nossas lembranças, fotos, escritos e desejos serão simplesmente esquecidos quando partirmos desta vida? Quem não tem medo do tempo e da finitude? “À duração da minha existência dou uma significação oculta que me ultrapassa. Sou um ser concomitante: reúno em mim o tempo passado, o presente e o futuro, o tempo que lateja no tique-taque dos relógios.”

Somos todos tão iguais em nossas diferenças! Por mais que nos expressemos de formas diferentes, sofremos das mesmas dores e corremos os mesmos riscos. Buscamos a felicidade a cada instante, até que notemos que primeiro precisamos simplesmente estar em paz com nossos pensamentos. Sem corvos rondando a mente... Nada mais justo do que permitir que todos conheçam o mundo e a si mesmos. “Que minha solidão me sirva de companhia, que eu tenha a coragem de me enfrentar, que eu saiba ficar com o nada e mesmo assim me sentir como se estivesse plena de tudo.”

Manual de Cambalhota...


Quantos sois vós?

Eis o espelho da sua mente...

Verde que quero ver-te!

09/08/2010

A Origem


Estou provavelmente no segundo nível dos meus sonhos. Provavelmente já ultrapassei a primeira camada e agora estou numa nova transposição, um sonho dentro de um sonho. Tudo ao meu redor é inesperado, com um toque de labirinto, mas com um Q de desafio. Não sei dizer com exatidão como fui capaz de percorrer estes caminhos, como se a seqüência dos fatos me parecesse impossível se fosse planejada. Cada milímetro que percorro hoje é completamente diferente do que rondava minhas pretensões.

Não acredito que eu esteja conectada em alguma máquina num outro mundo, compartilhando de um sedativo que me mantém presa em uma realidade criada pelo meu subconsciente. Mas tamanha engenhosidade do destino não poderia ser somente pensada por um ser naturalmente humano? E não seria mais óbvio este ser humano ser eu mesma, a própria arquiteta da minha realidade? Mas quem disse que eu iria desenhar o mundo assim, do jeito que é?

Quando assisti “A Origem”, não busquei o galã de Titanic, nem a adolescente grávida de Juno, mas vi a lei da gravidade se distorcer. Não esperei muito, muito menos um filme monótono, simplório e previsível. Mas daí a sair de lá com a mesma sensação de “Matrix”, é bem diferente! Nunca imaginei que essa idéia se repetiria novamente dentro da minha cabeça, cheia de neblinas e trovões. O eterno questionamento sobre vivermos numa realidade ilusória, que beira à nossa compreensão de fé e da existência de um possível paraíso do lado de lá, onde talvez tudo seja feito de um suposto composto real.

Quisera eu entender 0,1% da mente humana, talvez para simplesmente encontrar a razão nos fatos. Quisera eu ter certeza de que eu sou dona do meu destino, mesmo quando tudo parece conspirar rumo a um futuro que eu não esperancei. Porém, continuamente, passo a passo, tenho certeza de que por mais que eu me esforce, por mais que eu defina a minha existência em uma vida previsível, nada está em minhas mãos, como se eu fizesse parte daquele velho tabuleiro da vida, que talvez Lya Luft tenha descrito com maior delicadeza em “As Parceiras”. Somos peões, meros peões, assim me sinto hoje.

E o que fazer para retomar as rédeas da vida que se origina em nossos íntimos sonhos, elaborados religiosamente a cada noite mal adormecida? Como recobrar os sentidos entorpecidos por uma realidade que nos empurra, sem nos dar tempo para refletir se estamos no caminho certo ou no caminho que um dia projetamos como nosso futuro encantado? Não tenho solução, não espere por uma resposta milagrosa. “Eu sempre quis compreender: porque não entendo, escrevo. Como jamais entenderei, até o fim da vida tentarei expressar em palavras, linhas e entrelinhas, essa inquietação”. Lya Luft, “Em Outras Palavras”.

08/08/2010

Meu Deus, me dê coragem...

Clarice Lispector
(Ucrânia, 1925 - Brasil, 1977)

Meu Deus, me dê a coragem
de viver trezentos e sessenta e cinco dias e noites,
todos vazios da tua presença
Me dê a coragem de considerar esse vazio
como uma plenitude

Faça com que eu seja a tua amante humilde
entrelaçada a ti em êxtase
Faça com que eu possa falar
com este vazio tremendo
e receber como resposta
o amor materno que nutre e embala
Faça com que eu tenha a coragem de te amar,
sem odiar as Tuas ofensas à minha alma e ao meu corpo
Faça com que a solidão não me destrua
Faça com que minha solidão
me sirva de companhia

Faça com que eu tenha a coragem de me enfrentar
Faça com que eu saiba ficar com o nada
e mesmo assim me sentir como se estivesse plena de tudo
Receba em teus braços o meu pecado de pensar

05/08/2010

Off

Estou no meu inferno astral. Por isso prefiro não escrever muito, pois estou num momento suspeito. Ontem consegui rasgar algumas fotos, me desfazer de um velho álbum, um desapego quase assustador. Não estou no meu melhor humor, muito menos com paciência extra. Estou ácida, o suficiente para ganhar uma fama que não é minha. Euzinha, má? Um genocídio generalizado, dos meus peixes a seres humanos. O que há de errado com aquela água? Agora só restam as fêmeas, o último macho morreu ontem. Seria uma péssima bióloga, pois não aceito não saber a causa de todas as coisas... Ipês amarelos anunciam a fase que sempre é difícil.

Agosto, como sempre, Agosto.

26/07/2010

Biografia Esmiuçada

Cenas de cinema permitem uma expressão palpável de meus defeitos, qualidades e outros pormenores. Fiquei esperando alguém se manifestar e dizer se nota alguma semelhança com um poderoso chefão, ou com um príncipe da Pérsia, ou com um astronauta numa odisséia. Mas não ouvi nenhum pio na imensidão desta rede que nos conecta, mesmo com uma profundidade questionável diante das possibilidades que o cara-a-cara oferece.

Hoje sou feita de livros, tanto por aqueles que li, como por aqueles que ainda estão à espreita, como por aqueles que escrevi e escondi num velho baú de lembranças. Talvez hoje eu seja mais bem representada exatamente por aqueles livros que não escrevi, e que provavelmente nunca escreverei. Eis alguns que são marcos na minha memória, fora de ordem cronológica, exatamente para confundir a ordem da minha formação como leitora.

A Fonte dos Desejos dos Wuzzles: Acredite, o primeiro livro que comprei, quando ainda era criança, falava de um elefante que podia voar, dentre outros sonhos malucos deste tipo. Eleru... Eu e meus velhos elefantes... Do amigo invisível cor de rosa que eu escondia numa caixa de fósforos e que me garantiu a publicação numa agenda da Editora da Tribo... Ao meu feito de possuir uma foto em cima de um elefante. Claro, isso pra você pode ser insignificante, mas acredite: se apenas ao ler você já soltou um risinho no canto da boca, não sabe a diversão que reside nas pequenas coisas e nos mínimos desejos realizados, com ou sem uma fonte mágica.


Pra quem nunca ouvir falar do Eleru...


O Lobo da Estepe, de Hermann Hesse: Se eu posso dizer que um livro me mudou como pessoa, numa fase especialmente confusa de minha vida (aos 16 anos), eis o tal. Um rebelde quase sem causa, lutando contra si mesmo. “Uma vida fácil, um amor fácil, uma morte fácil – tais coisas não eram para mim”. Assim eu pensava aos 16, criando meus mundos intermediários, melancólica como os ídolos que hoje ganham fama em lutas de vampiros e lobos. Mas eu era aquele lobo, aquele velho rabugento. “Que havia sido de mim, que tivera as asas da juventude e da poesia, o amigo das musas, o viajante do mundo, o ardente idealista?” Sem mais.

Admirável Mundo Novo, Aldous Huxley: Você aí, que se sente um fantoche... Que não sabe se o futuro realmente está em suas mãos ou se você está simplesmente sendo manipulado, no estilo “Matrix”! Talvez mais uma forma de me agarrar à idéia de que a liberdade existe e que não somos peças num teatro social. Além de outros questionamentos... “(...) o sentimento religioso tende a desenvolver-se quando envelhecemos; tende a desenvolver-se porque, à medida que as paixões se acalmam, que a fantasia e a sensibilidade vão sendo menos excitadas e menos excitáveis, a razão é menos perturbada em seu exercício, menos obscurecida pelas imagens, desejos e distrações que absorviam; então, Deus emerge como se tivesse saído de trás de uma nuvem (...)” Mais uma vez, sem mais.

A Arte da Felicidade, Dalai Lama e Howard Cutler: Um dos livros que mais sofri para terminar de ler. Aquela sensação constante de ler um parágrafo e imediatamente sentir um remorso, ou mudar uma atitude, ou repensar um gesto. Nada tão facilmente digerido como o sorriso leve estampado na capa. “A ansiedade e a preocupação excessivas podem, como a raiva e o ódio, ter efeitos devastadores na mente e no corpo, tornando-se fonte de muito sofrimento emocional e até mesmo enfermidades físicas.” Ensinamentos de compaixão, aceitação e simplicidade – um choque para minha idéia egoísta de mundo, como se só eu pudesse sofrer naquela intensidade. Eis que os sentimentos somatizam sintomas, ou seja, nada como buscar a felicidade para se viver melhor.

Mulher Solteira Procura Homem Impotente para Relacionamento Sério, de Gaby Hauptmann: Se posso dar um conselho ao mulherio que ainda cria príncipes, aqui está. Nada melhor do que uma boa história, com a cara da mulher moderna, para te prender e nem por isso arrasar suas esperanças que um dia você pode ser premiada. Lembro-me como se fosse hoje: virei a noite, durante o período da faculdade, para ler o livro, presente de um amigo. Pena que naquela época eu ainda rabiscava tão pouco meus livros... Mas não me impediu de logo em seguida ler “Homem Bom é Homem Morto”, da mesma autora. O título feminista não deve te assustar!

Contato, de Carl Sagan: Não bastava o filme – precisava ler o bendito, direto de quem o inventou. Acho que nada jamais conseguiu se aproximar do meu conceito de fé como as idéias deste livro. Fé no divino e no humano. Uma pergunta constante sobre a existência de Deus e vida em outros planetas, o questionamento de uma ilusão coletiva e uma ciência suspeita, mas uma frase definitiva: Se o universo está todo vazio, isso sim é um tremendo desperdício. Não posso negar que todas as naves espaciais que construí nos meus quintais e no terraço do prédio me prenderam à possibilidade de uma grande descoberta, como as que Arthur Clarke acredita que serão feitas quando pesquisarmos os mares de Europa, a lua de Júpiter. Por este mesmo motivo, acabei me deparando com “Bilhões e Bilhões”, do mesmo autor.

Outra Vez, por Ernesto Che Guevara: Não tenho nem um traço de guerrilheira, mas sofri com a asma durante anos e aos 14 quis ser médica. A vontade passou logo, pois outros dois desejos me moviam ardentemente – a oceanografia e as viagens pelo mundo. Obviamente neste livro me deparei com o segundo traço de minha personalidade, que carregarei por toda a vida. Nem tudo era política ou revolução para Che nesta fase de sua vida e através dele viajei por toda a América Latina que tanto me atrai. História, gente, cultura, natureza. Resultado: Desde então tracei todos os meus planos de viagem para os próximos 20 anos, mesmo que eu não consiga realizar todos. Além disso, passei a carregar qualquer coisa de Che quando viajo, talvez numa superstição idiota, mas para mim é como um ritual de comemoração. Em Chichen Itza, onde Che também esteve, eu estive e pisei nas terras de maias e astecas. Em Buenos Aires, onde Che viveu alguns bons anos, eu também estive. Ainda faltam muitos lugares... Sem guerrilhas.

Em Busca do Sonho, de Heloisa Schürmann: Como se não bastassem as viagens de Che, eis um livro onde o mar representa uma opção de vida. Uma viagem feita por uma família contemporânea, com meios reais e planejáveis. Não, não pretendo velejar assim... Mas este livro me rendeu outras tantas opções de destino para toda uma vida. Não sei, porém, se terei tanto tempo assim. O mundo ainda é grande demais para o meu bolso, apesar de ser miúdo nos meus pensamentos. Escrevi uma carta para a família Schürmann, concorrendo a uma vaga temporária no veleiro. Não era um e-mail. Nunca recebi resposta. O jeito é ir com meus próprios pés e sonhos. Quem sabe eu também não encontre uma fonte dos desejos e possa desfrutar de algumas asas temporárias? Vou alternando entre as previsões de grandes pensadores e aventuras rumo à Ilha Maurício...


Abeleão, Hipocó, Rinocaco... Etc!