18/06/2010

Saramagueie


“O mundo é tão bonito e eu tenho tanta pena de morrer...” Disse a avó de José Saramago, criadora de porcos sem pérolas, mãe de uma faxineira que um dia matriculou seu filho numa escola técnica. E do mecânico ao equilibrista das palavras, Saramago se descortinou, ainda que tardiamente. "Há esperanças que é loucura ter. Pois eu digo-te que se não fossem essas, eu já teria desistido da vida." Escreveu José Saramago (Ensaio Sobre a Cegueira) e hoje reli graças à Natália.

Quando vi Ensaio Sobre a Cegueira nas telas do cinema me senti uma leitora fajuta. Como li pouco Saramago! Como procurei pouco de Saramago! Mas ainda assim saí do cinema catatônica, escrevi o costumeiro comentário sobre o filme (claro, escrevo quando merece). E fiquei imaginando quão intenso deveria ser aquele livro que não li, já que mesmo nas horas resumidas de cinema o mesmo alcançou meu estômago. Saí perplexa com a minha cegueira. Descobri que é preciso "saramaguear", diria Guimarães Rosa, para que talvez um dia alcancemos a compreensão que nos falta.

Não precisamos ler tudo e todos, muito menos conhecer toda a obra literária que a crítica valoriza ou que se transforma em pó. O que importante é pensar - não apenas ler, copiar, citar. Acredito plenamente que todo escritor, de reconhecidas editoras ou de diários escondidos, concorda comigo. Escrever não é um exercício de transcrever pensamentos, mas sim de organizá-los, conhecer a si mesmo, socraticamente, e talvez conseguir que um grão do mundo se transforme em boa obra - não literária, mas humana. Que Saramago descanse em paz, pois suas obras transcenderão sua passagem terrena e ainda alcançarão muitas mentes abertas à constante revolução do pensamento.

3 comentários:

  1. Salve Saramago!

    "Se tens um coração de ferro, bom proveito. O meu, fizeram-no de carne, e sangra todo dia."


    amém.

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  2. Frase linda né? de uma obra mais linda ainda! Que "minhas" frases rendam mais e mais estalos carol! Adorei!

    bjus

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