19/12/2012

Nossa mala velha...

Hoje uma amiga dos velhos tempos me disse que estava saudosista e que ficou surpresa ao descobrir o meu blog. Bem típico de Dona Dani não saber que um blog existe há 3 anos e ainda por cima ficar emotiva ao ler alguns textos e se lembrar do meu jeito de contar "causos" como fazíamos nos bons tempos, sentadas na pracinha esperando o carro do velho príncipe encantado passar... A verdade é que somos feitos de histórias, estórias e casos pra lá de absurdos, que só a nossa memória será sempre capaz de reproduzir... E mesmo assim o tempo aos poucos nos garante a vantagem da distorção, tornando tudo mais heróico, ou reduzindo as dores, minimizando os medos daqueles tempos, ou talvez até deixando mais brilhantes os amores e aventuras. 

Somos um apanhado de situações que, a cada pessoa nova que entrar em nossas vidas, nunca conseguiremos repassar tudo que vivemos, por mais que todo dia a gente se dê ao trabalho de contar algo que já vivemos... E o pior: a gente nem se dá ao luxo de fazer isso pra se conhecer melhor... No máximo contamos sobre as férias do ano passado, das viagens que já fizemos (e bem por alto, talvez só aqueles pontos mais incômodos ou os mais malucos), ou falamos dos traumas já vividos quando alguém vive uma situação parecida... Afinal, tem horas que nem a gente tem paciência pra ficar revendo filme repetido, explicando tudo de novo pra várias pessoas, só pra que alguém talvez um dia entenda como chegamos aqui, desse jeito que agora a gente é. 

A questão é que só a gente sabe o que leva cada um de nós a ser do seu jeito. Cada um tem uma bagagem, cada um viveu uma vida totalmente sua. Não há ninguém sequer parecido com o próximo nem mesmo dentro da própria família ou casa. Mas o difícil é que nem todo mundo carrega nessa bagagem o respeito pela bagagem alheia... E aí fica complicado tolerar, tolerar-se, entender, respeitar, ceder. Se você não aprende nesse tempo todo que cada um tem seu limite, ou precisa de certo espaço, de repente invade o outro, magoa, se impõe e o pior: tenta mudar a essência do outro, ferindo o seu direito primordial. 

Daí me lembro de novo que quando era ainda pré-adolescente (e ainda restam uns 20% dentro de mim dessa figura pitoresca, mesmo que adormecida e pouco representada em meus escritos antes melancólicos e agora bem mais pragmáticos), eu carregava a bandeira da liberdade a todo preço. Tudo que contrariava esse direito me feria tão dolorosamente que eu mais parecia uma militante em tempos da ditadura do que muitos que lá estiveram. Tudo que definisse uma regra, um limite, um padrão (até estético), era uma afronta aos meus princípios... Saudade daquele ardor ideológico, mas nem tanto do sofrimento por me sentir incapaz diante dele, inerte, inútil ou inutilizada, a palavra me fugiu... 

E aqui estou eu, a adulta que ainda escreve pra ninguém, palavras ao vento, sem os velhos diários abandonados por uma questão tão prática que assusta: a invasão descoberta e a sinceridade finalmente entendida como fragilidade. O velho hábito de escrever que nunca se foi permanece como um desabafo, para nada, ou para simplesmente organizar as ideias, ou para que alguém um dia leia, ou se veja refletido... Não espero que ninguém tenha a mesma bagagem, mas que os meus rabiscos sejam de algum modo válidos. 



Coisas assim eu levo na minha bagagem... Você é quem diz o que leva na sua...

17/12/2012

O fim

Vamos falar da pauta em alta: o fim do mundo na próxima sexta. Os caras eram bons em astronomia e geometria, mas não venham me dizer que os maias eram os mais inteligentes... Senão, seríamos hoje mais maias do que espanhóis. A questão é que para muitos malucos por aí em poucos dias tudo vai virar pó, ou algo do tipo. Mas o fim do mundo vem sendo anunciado há tempos, desde que me entendo por gente. Quando era criança, me assustaram com as profecias de Nostradamus. Quando cresci, ouvi muitos falarem dos trechos do Apocalipse. E tantos outros agora dizem que os maias sabiam disso há mais de 500 anos e que num bloco de barro rabiscaram o rumo da nossa história. 

Mas o Alcorão, os eco-chatos, os suicidas também dizem que o mundo vai acabar um dia. E os mais pessimistas, dizem que em breve - muito breve. Tenho medo das tempestades solares - o que seria de nós sem energia elétrica? Colapso. Aí me lembro de "Ensaio sobre a Cegueira", com todo mundo meio insano, doido, desorientado ou virando zumbi no estilo "A Lenda". Então, que se for pra acabar, que acabe triunfante - que exploda, que inunde, que vire pó. Pra ninguém sofrer, pra ninguém se matar, pra ninguém chegar ao seu pior. 

Mas se o mundo não acabar (de novo), que o mínimo possível de pessoas se mate por achar que antes de meia-noite o céu acabará em chamas. Tenho compromissos pós fim do mundo, então se eu chegar atrasada, não é porque no meu fuso horário o mundo acabou antes, ok? E este é só um post desconexo, pra ficar na Matrix, caso o mundo acabe, e os ETs algum dia encontrem nossos registros sobre nossas vidas. Ou será que primeiro os Bilderbergs vão filtrar essa publicação idiota, ao estilo Mãe Diná? Tenha dó! Quem sabe do fim do mundo não vai te contar. 

13/11/2012

Ilusões do Ouro de Tolo

Sou facilmente percebida por métricas: quantas fotos tiradas, quantas fotos reveladas, quantos posts escritos, quantos posts públicos, quantos compromissos agendados, quantas festas presenciadas. O meu ser social representa a minha "efetividade" diante dos fatos: ou sou, ou não estou mesmo a fim de ser. Simplesmente quero estar ali, ou não quero sequer fazer parte... A questão é que 2012 pode não ser mesmo o fim do mundo, nem pros maias, nem pra mim, nem pra você, mas de alguma forma é uma mudança radical no meu jeito "sociável" de ser.

Nunca fui tão rabugenta, nunca fui tão azeda, nunca fui tão mau humorada, talvez nunca tenha sido tão séria e talvez tão fria e madura. Pra grande maioria, claro, isso é quase imperceptível. Mas pra quem tinha como padrão alguém tão presente, quase sempre disponível, tão constante, 2012 pode ter sido um choque. Um choque cultural, uma ruptura nas convenções que provavelmente mais me sugavam do que me davam espaço... Mas tudo tem seu outro lado: faz falta aquela leveza, faz falta ser mais amável. Afinal, a doçura e suposta amabilidade social têm suas vantagens. 

Só que o peso, o esgotamento, a falta de tempo pra me debruçar em cima dos meus próprios medos, encobertos durante tanto tempo (sim, já fui essa rabugenta em outra fase da vida... isso é cíclico), fizeram com que eu parasse de olhar pra minha vida real, pro meu mundo miúdo cheio de questões pra ponderar, pesar e resolver. Sim, a pessoa amável tem dúvidas, problemas e questões. Só porque aparento ser leve não quer dizer que não tenha dentro de mim um turbilhão pesado de maluquices... 

Quando notei, estava aqui, cheia de coisas pra rever, hábitos pra mudar, comportamentos pra repensar. E ainda são vários, congelados - muitos deles completamente fora das minhas reais possibilidades de seguir adiante. Sim, eu preciso me mexer, mudar, revisar meus conceitos. Retomar alguns dos quais andei me desapegando ao longo desses anos de pessoa "leve" - e, agora que vejo, talvez superficial. É hora de retomar as rédeas da vida real, com seu peso real, deixando de lado as manias absorvidas neste tempo maluco que só Cazuza daria conta... Fascinação pura, ilusão que entorpece. A vida consegue te fazer isso, é muito fácil se deixar levar. 

É hora de deixar o cavalo-marinho contar suas histórias por aí, em outras bandas... E que este ciclo de azedume me ajude mais uma vez a voltar aos eixos, com os pés no chão, ainda em tempo de consertar o que está errado, retomar do ponto onde parei e aprender com o que já vivi. Que as doces ilusões dessas primaveras entorpecentes fiquem como boas lembranças, mas que sirvam de lição para as próximas aventuras, um pouco mais "comedidas", mais amadurecidas, menos desvairadas. Pois nem tudo que reluz é ouro. 

11/10/2012

#PADI: Sofri, mas consegui!

Há 10 anos eu me aventuro pelas águas salgadas, cumprindo uma promessa feita para o meu diploma. Se eu não podia ser oceanógrafa, que me realizasse de outra forma, que buscasse minha felicidade em outros caminhos sem perder a ligação com aquele velho sonho. Já se vão 10 anos sempre revisitando o velho amigo, "Omar". Em 2002, meu primeiro mergulho, eu achava que respirar menos debaixo d´água era vantagem. Economizava ar sem saber o risco que corria, só pra ficar mais tempo na água. Mas meu padrinho de mergulho me disse que eu tinha me virado bem, e eu acreditei. De lá pra cá, eu tinha certeza absoluta que já tinha vencido os primeiros obstáculos na água, que o mar nem era tão mau humorado assim. E o histórico de mergulhos se deu na seguinte sequência: 

- 2002 - Morro de São Paulo - Bahia: peixe morcego, aranha do mar, a minha primeira vez.
- 2004 - Maragogi - Alagoas: sargentos, donzelas, peixes esverdeados, a água mais clara de todas e a noite sem dormir de tanta ansiedade (tive até asma).
- 2005 - Fernando de Noronha - Pernambuco: frades, mergulho em caverna, o sobrevôo no naufrágio, os cardumes no mergulho de reboque, o canto dos golfinhos na água, os ouriços brancos, a moréia de chifre.
- 2006 - Itacaré - Bahia: snorkel em Maraú, valendo a citação porque fiquei presa no coral...
- 2007 - Guarapari - Espírito Santo: a linda arraia-manta, muitos peixes diferentes.
- 2008 - Cancun - México: o tanque com os golfinhos e o snorkel em Xel-Ha com vários tipos de peixes.
- 2009 - Abrolhos - Bahia: as baleias jubarte e um mergulho frustrante, que foi facilmente superado pelo snorkel em volta da ilha com direito a perseguir uma tartaruga e ganhar uma cicatriz no punho.
- 2010 - Arraial D´Ajuda - Bahia: um mergulho com visibilidade ruim, um segundo mergulho excelente com lindas fotos e peixes coloridos (o frade cinza e amarelo, peixe porquinho, cirurgiões, budiões) e um snorkel surpreendente, com direito a um caramujo com uma estampa que merecia ser usada num vestido de verão.
- 2011 - Ilha de Páscoa - Chile: conheci Henry Garcia, da equipe de Cousteau, mas não pude mergulhar no ponto do moai naufragado porque não tinha certificação...
- 2011 - Arraial do Cabo - Rio de Janeiro: nas águas cariocas geladas, finalmente consegui ver cavalos-marinhos em seu ambiente natural - uma marrom e um branco, lindos, super pequenos...
- 2012 - Oranjestad - Aruba: o ponto de mergulho de Pos Chiquito levou o meu cavalo marinho que mergulhou por quase todos os pontos acima, mas finalmente consegui a minha certificação Open Dive Water. E é sobre esse episódio que se trata este post... 

Dia 1: O plano inicial era apenas mergulhar uma vez, conhecer o mar de Aruba "do lado debaixo" e marcar mais um ponto na ficha. Busquei informação numa cabana na praia de Palm Beach e me recomendaram a Sea Aruba, que já marcou meu mergulho pra sexta. Na data marcada, a ajudante me buscou, bastante simpática, nativa de Aruba e, como a maioria, falava desde holandês, até espanhol, inglês, papiamento e entendi o meu enrolation em português. Avisou que eu iria mergulhar com um polonês, que todos os instrutores só falavam inglês e assim fui, mais uma vez, com essa cara de pau que Deus me deu. Ele falava um inglês bem fácil de entender, era simpático e tudo correu muito bem, apesar do meu desespero nos exercícios com a máscara já na praia... Afinal, eu tinha que cumprir pelo menos 3 "skills" obrigatórios naquele mergulho... No tira e põe da máscara é que provavelmente fiquei sem meu brinco, no mar mesmo... Mas enfim... Sem o compromisso de ser avaliada, consegui executar os procedimentos e entramos pra água... Fora a minha respiração, que já ferrava com minha flutuabilidade, dentro d´água eu até me viro bem. E daí que achamos uma tartaruga, bem na dela, parada na areia. Cutuquei o polonês, que nem tinha visto a bendita, bati umas fotos até me aproximar bem, passei a câmera pra ele e não perdi a chance. Agarrei a tartaruga e saí nadando com ela, alguns bons segundos... Mansa, tranquila, completamente despreocupada. Vi moréias, bem de perto, um barquinho naufragado que rendeu fotos bem legais, mas nada se compara ao momento com aquela tartaruga, totalmente em paz e sem medo. Parada de 3 minutos em 5 metros por segurança e tudo deu certo, exceto pelo brinco, que só dei falta quando cheguei no hotel... Satisfeita com essa história toda, por ter conseguido me comunicar bem com o polonês gente boa e por não ter feito nenhuma burrada enorme, perguntei: afinal, quanto custa o curso aqui? E quantos dias eu precisaria? Respostas bem mais positivas e animadoras do que eu esperava, saí de lá com aulas agendadas e mais 3 dias da viagem totalmente comprometidos para a certificação. Já era hora. 

Dia 2: Tédio, puro tédio. Vídeos em inglês. Horas a fio numa sala, ou muito quente ou com ar condicionado (odeio!), ouvindo um DVD com termos técnicos que eu tinha que fixar bem os olhos pra adivinhar de qual parte da roupa de mergulho estavam falando, ou de qual lei da física estavam explicando... Tenso! Imersão total no inglês técnico de mergulho, que nunca usei e que graças às imagens do vídeo consegui digerir uns 75%... Entretanto, era informação para se absorver em semanas e eu estava consumindo tudo aquilo em um só dia... Em outra língua... Sem intervalos longos, sem almoço, sem nem sequer colocar o pé no mar azul maravilhoso lá fora. Um dia em Aruba foi totalmente perdido dentro de uma sala de aula. E pra cada um dos 5 módulos de aula, uma série de questões de um livro (em inglês, claro) com 200 e tantas páginas e mais um teste final em cada parte, incluindo questões discursivas. Pensem numa pessoa esgotada? No final da tarde, eu só pensava em desligar a cabeça, que tinha se esforçado em dobro naquele dia. Corri pro Mc Donalds no dia. Tinha que afogar meu cansaço em algo pelo menos mais próximo da minha realidade... Descobri que todo sanduíche lá tem picles. rssss Aff! 

Dia 3: Ela, a professora, holandesa. Nada do polonês bonzinho. Inglês com sotaque puxado pro britânico e já me dando atividades que exigem coordenação motora. Quem me conhece, sabe bem... Se tem uma coisa que não sou boa, é lidar com coisas manuais... rsss Enfim, começou me dando uma sequência de ordens em verbos e conjunções em inglês que eu não entendia, e eu tentava arrancar dela as ações pra que eu pudesse ao menos repetir e assim conseguir me virar. Não foi fácil e foi assim o dia todo. Saudade da aula teórica... Na água, vários exercícios em que ela fazia e eu devia repetir. A questão é que ela me explicava tudo fora d´água e meu receio era: se eu não tiver entendido direito, lá embaixo já era. Eis o problema de se fazer um curso desses em inglês... Onde eu estava com a cabeça? Mas a questão era: onde estava o polonês bonzinho e paciente? rsss Ela era rigorosa, exigente e bem menos paciente, fato. Os holandeses são assim? Tomei muita água lá embaixo, fazendo exercício de limpar a máscara com água dentro, de tirar a máscara debaixo d´água e colocar de volta, limpando até a água toda sair... A garganta já estava queimada de tanto sal, de tanto trocar de regulador, de tanto inflar a jaqueta com a boca, etc. Os exercícios de flutuabilidade nem eram os mais vexamosos, pior era conseguir ficar na vertical sem parecer um balão dentro d´água (e olha que eu tinha mais lastro com vários pesos do que o normal). Ana, you are a balloon! Que ódio! Chamar uma mulher de balão não é justo! rssss E ela me torturou até o último segundo. Depois da aula prática, morta de fome, hora de corrigir os exercícios teóricos. Fiz de 80 a 100% nos testes fechados e os demais nós discutimos. Aí ela descobriu que eu não sabia nada da tabela de cálculo de espaço de tempo entre mergulhos, resíduo de nitrogênio, etc. Claro, isso não estava nos vídeos! Ora, mas tinha um livro na pastinha... É, eu não li. Estava esperando alguém me explicar. Só que aí a paciência dela já era -1. Eu me senti a topeira do século, porque ela definitivamente não conseguia me explicar... Resultado: falei que eu ia estudar em casa e que na prova final eu iria conseguir. Quando pedi pra me deixar em Eagle Beach perto das Divi Divis, ao invés de me deixar no hotel, ela conseguiu me deixar no ponto errado da praia, e tive que tomar um ônibus pro ponto certo. Sacana é apelido. Mas tudo bem, eu não ia desistir. 

Dia 4: Programação do dia: saída de barco (risco de enjoar), dois mergulhos práticos de avaliação (não sabia quais seriam os exercícios, mas o lance de tirar a máscara é sempre obrigatório) e prova teórica depois. Pra começar, atrasaram pra me buscar no hotel. Quando cheguei no barco, estavam todos me olhando como se eu fosse a "palerma" do ano. Que beleza! Eu era a única sem certificação, só tinha tiozão ninja, megaequipado... Um divemaster iria descer também comigo e minha avaliadora holandesa mau humorada (que às vezes fazia uma piadinha pra tentar amenizar minha cara de velório) para ajudar no procedimento. Ele seria meu companheiro de mergulho, uma regra da certificação - jamais mergulhar sozinho e sempre "olhar pelo outro". O primeiro mergulho sempre é o mais profundo e claro, nada de levar máquina fotográfica... Nem a bruaca podia levar pra me fotografar? Não, segundo ela, tinha que nos observar, e não pode fazer isso em processo de certificação. Ah, mas o polonês faria! Ela avisou quais seriam os exercícios de avaliação: máscara, flutuabilidade, inflar a jaqueta com a boca, trocar o regulador pelo alternativo com o companheiro e fazer o procedimento de ficar com o tanque sem ar, fechado. Pânico total, isso a 18 ou 20 metros. Pra começar o divemaster já caiu na água vomitando... E eu lá, de boa... Tensa!!!! Tomei água na máscara, esqueci de apertar o BCD  pra inflar a jaqueta, mas até que tudo saiu do jeito que tinha que ser... Mas minha respiração, ah, ela é uma merda! Como eu preciso das minhas aulas de yoga!!! Exhaile, Ana, exhaile!!!! 4 segundos inspirando e uns 10 expirando, se possível, para não parecer um balão dentro d´água e descer, sem problemas! Demorou, mas entendi... Mas quando batia o cansaço, eu só queria respirar normal, e dava mesmo era vontade de subir pra superfície... Aí a máscara começou a embaçar e quando percebi, eu mesma já estava deixando a água entrar na máscara pra dar uma limpada na visão, logo eu, que odiava limpar a máscara!!! Quando notei, estava ao lado de um maravilhoso naufrágio de um navio, enorme, cheio de corais e muita vida, mas que nem curti tanto porque estava mesmo era exausta e prestando atenção na avaliadora pra saber o que tínhamos que fazer em seguida. A verdade é que estive lá só pra ser avaliada, mas meu coração ficou em casa! E o pior: não tenho fotos pra dar uma mãozinha na memória de uma pessoa em momento de estresse... Subimos (nem vou comentar a luta pra subir no barco), um tempo no barco e segundo mergulho... O polonês perguntou por que eu não estava rindo... E eu disse o nome da avaliadora, indicando que ela era a causa do problema... Ele disse que me entendia. O segundo mergulho foi literalmente pra cumprir tabela. Foi num ponto onde eu já tinha feito snorkel no dia anterior, era mais raso e não tinha aquele navio lindo. Novamente o exercício da máscara e dessa vez eu nem sofri tanto. Fui muito bem no exercício da navegação pelo aparelho (relógio de pulso com pólo magnético e a "Lummer Line" para ir e voltar no mesmo sentido mesmo sem visibilidade), acertando milagrosamente de primeira - logo eu, que sou a mais sem rumo, como todo mundo sabe - afinal, nem carteira de motorista tenho... Fiz um exercício patético de flutuabilidade na posição de Buda - não ficava reta nem a porrete... Era cômico... E acho que a venci pelo cansaço... E depois ficamos nadando em vão... E foi quando bateu o cansaço mesmo... Bem no finalzinho, quase chutei o balde... Estava sem ar, sem paciência, perdendo a flutuabilidade, nervosa, e não tinha como gritar. Essa é a única desvantagem do mar: você não pode gritar, ninguém pode te ouvir. E naquele instante a única coisa que consegui fazer foi rezar um "Pai Nosso", desesperadamente. Até que eu conseguisse recobrar a consciência do esforço que já tinha feito até ali... Consegui finalmente recuperar o ritmo da respiração, aos trancos e barrancos, e fizemos mais um exercício de nado com uso do regulador de emergência do companheiro de mergulho, até o ponto de parada de segurança, onde milagrosamente conseguimos ficar parados com a flutuabilidade certa... De volta pro barco, morta, quase não consegui subir no barco. Estava exausta. Não tinha forças e definitivamente cheguei à conclusão de que não tenho mesmo musculatura alguma pra essa parte pesada do serviço. Se ouvi parabéns, claro que não, só o divemaster puxou papo comigo, falou que meu inglês era bom, eu nem queria mesmo conversar... Ainda faltava a prova teórica com 50 questões... incluindo aquelas malditas questões sobre a tabela... E lá fui eu... A avaliadora me entregou um tipo de apostila e mandou eu fazer o Exame A. Não vi que tinha diferença entre Exame A e Exame Final A, mas em inglês tinha... rsss... Resultado: fiz umas 10 questões a mais e óbvio, rasurei o gabarito. A avaliadora logo disse: se quer passar, tem que fazer pelo menos a prova certa. Nada sutil, nada gente boa. Mas ao menos se despediu e foi embora, me deixando em paz pra fazer a prova sozinha. Demorei, fiz a prova toda, aprontei a maior confusão nas questões da tabela quando vi que estava em metros e não em pés. Eu tinha aprendido a tabela imperial, em pés, e de repente a prova era em metros? Saí convertendo tudo, desesperada, e nenhuma resposta batia... Chamei o meu amigo Jack, o senhor que ajudava na operadora, e pedi ajuda... Ele descobriu que mais a frente estavam as questões em pés e daí que lá fui eu recalcular tudo de novo... Bom, pelo menos eu descobri que sabia mesmo fazer as contas e usar a tabela... Só não sei é converter metros em pés, pelo visto. Fim da prova, chamei o outro professor pra corrigir, tudo na lata, na hora... Detalhe: marido dela. E ele foi corrigindo... E de repente começou a marcar um monte de erros. Eu falei: opa, não está olhando o gabarito errado? Ele voltou e conferiu, e estava mesmo... Saiu corrigindo tudo de novo e fiz 86% da prova. Ufa! Acabou o sofrimento assim, com novela até o fim! 

Esse post é um recado pra quem ainda não tomou coragem de se certificar... Eu resolvi fazer tudo do jeito mais difícil, mas não precisa ser assim pra todo mundo: ninguém precisa fazer os exercícios logo de cara na correnteza do mar, nem aturar uma Diana da vida, nem ficar frustrado por não poder fotografar um mergulho bonito... Ninguém precisa ficar angustiado por não ter certeza se entendeu o procedimento direito por estar fazendo o curso numa outra língua! As operadoras de mergulho espalhadas pelo Brasil já têm o material traduzido há anos e ninguém precisa ficar sofrendo 3 dias pra entender uma loira mau humorada pra conseguir o mesmo que eu consegui. Eu só paguei o meu pecado por demorar tanto a me certificar naquilo que eu já devia estar escolada faz tempo. Mergulhar com segurança, conhecendo mais sobre os procedimentos e entendendo como tudo funciona, além de melhorar a respiração, ajuda bastante! A minha lição principal foi: respiração, Ana, respiração! 

Obs: Talvez eu precise de uma nova aula pra saber os nomes reais das coisas, porque decorei em inglês mas não arrumei ainda um tradutor pra tudo... rsss Qualquer erro no inglês nas poucas palavras escritas acima, favor desconsiderar, já tá ótimo! :)




Cara de feliz no primeiro dia... Nos outros dias, "no photos, Ana"! 

24/07/2012

Você Nunca É

Você nunca é bom o suficiente. Por uma razão simples: você nunca é o que o outro projeta. E o pior: por mais que você se esforce, nunca será perfeito. Nunca será a pessoa ideal, o filho ideal, o namorado ideal, o empregado ideal, o chefe ideal, o professor ideal, o amigo ideal, o irmão ideal, o pai ideal, o escambau do ideal. Nada que você faça, por mais que faça todo santo dia, por mais que você se esforce pra ser o seu melhor, jamais será o suficiente pra ele, pra ela, pra qualquer um. Talvez só sejamos bons ou quase tão "bons demais", para nossos concorrentes, ou nossos inimigos, ou nossos malfeitores. E talvez seja o inimigo o único que possa nos ensinar a prática da virtude da compaixão e da tolerância, como disse o Dalai Lama. Eis uma intrigante contradição. 

A questão é que você sempre está fazendo mais do que deveria quando pensa no quanto ganha todo mês (no seu ponto de vista), mas deveria ser mais pró-ativo, inovar e provocar mudanças com resultados (no ponto de vista do seu líder), enquanto poderia estar trabalhando em outro lugar que te pagaria melhor (no ponto de vista do mercado).  Enquanto você acredita que realmente está fazendo a diferença, é reduzido ao pó. Enquanto você salta troncos de árvores, dizem que você tropeça em palitos. Ou que você sempre parece ser sempre o filho ingrato porque não diz obrigado todo dia (no ponto de vista dos pais), enquanto se esforça pra ser independente, ser um bom profissional, não levar problemas pra casa e só dar notícias boas (no seu ponto de vista, isso é sucesso, a melhor recompensa pelo investimento), mas para outros você é o filho relapso, grosseiro, sem paciência, desligado e que não divide com a família suas questões (no ponto de vista dos apegados).

Talvez você seja o mais ausente dos amigos porque não pode estar presente nos eventos nos horários que são mais convenientes para todos, mas não são mais tão fáceis pra você, e automaticamente seja excluído de tudo porque amizade só faz sentido se for presencial mesmo no mundo virtual de hoje (para os mais antigos), mas a questão é que você continua tentando dizer que está ali, pronta pra ajudar quando for realmente necessário e que nem por isso quer deixar de ser participado das boas notícias ou dos problemas para poder ajudar (no seu ponto de vista de quem não é onipotente e muito menos onipresente). E ainda por cima você não pode ser a namorada perfeita da televisão, pois você não gosta mesmo de academia, tem opiniões diferentes, não nasceu pra ser Amélia, tem outras prioridades para administrar ao longo do dia e equilibrar com uma vida emocional saudável sempre que possível (no seu ponto de vista), mas claro, você pode ser egoísta, egocêntrica, radical, teimosa, fria e quase ausente quando nem tudo gira ao redor do ente amado (no ponto de vista dele, acostumado a esperar a mulher perfeita que não existe). 

Se você quer que os outros sejam transparentes e honestos, quer que tomem uma atitude e assumam uma posição, você é o rebelde e indisciplinado. Você é o líder do motim enquanto os outros, residentes do país "em cima do muro" preferem não levar o problema à tona. Ora, quem não leva problema, mas não leva solução, pelo menos sai no zero a zero! Mas claro, se você prefere discutir, resolver, você não é bom o suficiente, pois demonstra que todos somos frágeis e pecamos nos mesmos pontos: sejamos filhos ou pais, empregados ou patrões, donos ou locatários, em qualquer uma das posições. Você nunca é, baby, nunca é...

Ou você é o cachorro perfeito ou não é. Ou você é o artista perfeito ou não é. Ou você é o cientista perfeito ou não é. Isso não existe. Mas... Se você ajuda muito, está com tempo sobrando. Se você sabe demais, é um risco. Se você pergunta demais, incomoda. Ou você é do jeito que o outro quer ou não é. Mas só é perfeito pra quem está na disputa, nunca para quem te observa ou para quem deveria se colocar no seu lugar. Retornamos ao ponto mencionado pelo Dalai Lama: a compaixão. A gente espera do outro a perfeição, mas não queremos que esperem de nós que o sejamos. A gente nunca é, simples assim. É assim todo dia, pra qualquer um, sentado em cima do próprio rabo. 


17/07/2012

Mindset da Ruptura

Crescemos acreditando numa série de circunstâncias históricas, psicológicas e emocionais que perdemos o hábito de exercitar nossa própria liberdade de pensamento. Somos tão cartesianos e moldados pela nossa geração, que não nos permitimos ser atemporais, livres para propor novos modelos mentais sobre a vida, sobre os relacionamentos e sobre os planos para o futuro. O resultado é que todas as gerações que antecederam a minha (chego aos 30 em breve) provavelmente se sentiriam perdidas se lhes fosse concedida a verdadeira liberdade: para agir, para pensar, para ser. 

Sou de uma geração limítrofe, aquela que começou a sofrer com a mudança e que aos poucos tem acesso ao mundo de verdade. Estamos descobrindo as verdades antes encobertas e que jamais aprenderíamos nas escolas. Assim como ouvi hoje, nas práticas palavras da consultora Denise Eler, "fomos durante muito tempo criados para pensar na solução dos problemas, mas não para criá-los, discuti-los, analisá-los como parte do processo de aprendizado". E agora resolvemos nos abrir para estes questionamentos: os por quês, para onde, de onde, para quem? Vieram em ondas incontroláveis na ponta da língua dessa tal Geração Y que muitos julgam insuportável. Mas não é assim que realmente chegamos à compreensão dos fatos? Se partimos direto para a solução, num pensamento matemático frio e sem contexto, não deixamos de lado o lado humano da coisa? 

Durante muitos anos, a sociedade, a economia e as pessoas pensaram que a solução para tudo estava na razão, na ciência, pura e lógica. Mas vamos citar aqui uma situação histórica que mudaria a forma de pensar de todos nós, cartesianos, darwinistas, tayloristas, fordinianos puros, steve jobinianos ao quadrado que somos. Em meados de 1433, bem antes dos anos dourados da marinha mercante européia que nos colonizou lá pelos anos de 1500, você saberia dizer quem era o país que detinha a frota mais moderna de navios navegando pelo mundo? Em algum momento nas salas de aula você ouviu algo diferente de Espanha, Portugal, Inglaterra, França... Talvez os árabes? O poder era dos chineses, com seus magníficos navios com velas vermelhas. Só não fomos colonizados por chineses pois o imperador que impulsionava o domínio além das muralhas chineses faleceu repentinamente e o novo governante, por algum motivo, decidiu voltar-se novamente para a China dentro dos velhos muros. Eis que assim a história, como num imenso tabuleiro, criou o mundo tal como conhecemos hoje. E você ainda insiste em acreditar que nunca foi enganado pelas teorias alheias. Os nossos livros apenas nos ensinaram a versão dos fatos que nossos antepassados europeus queriam que fosse contada... E assim pouca gente sabe que os chineses não estão apenas invadindo o mercado de hoje, mas já fazem parte da história há séculos. 

O que a China tem a ver com isso? Os chineses hoje pensam "fora da caixa". Basta pensar na velocidade. Os orientais, de uma forma geral, já conseguem se abrir para a mudança. Talvez porque eles tenham aprendido com sua própria história a superar inúmeras crises, de diferentes tipos e seriedades. Da bomba atômica aos governos vermelhos. A questão é que os modelos ocidentais ainda pensam nos moldes da era industrial, como se a melhoria contínua ainda fosse suficiente para seguir adiante. O mundo mudou, pois as pessoas estão mudando. E por este motivo pensar diferente é uma questão de sobrevivência: não bastar melhorar, é preciso mudar. Uma melhor prática, a gestão do conhecimento por si só - não basta no que alguns chamam de "era conceitual". Enquanto você ainda entende na faculdade sobre a Sociedade da Informação, sinto muito, o bonde passou assim como os navios dos chineses se perderam na história - estamos vivendo outro momento. Estamos no momento em que a melhor prática é substituída pela nova prática - ruptura. A história mudou drasticamente pois é preciso ser veloz, é preciso ser diferente e inovador. 

E aí voltamos aos benditos insuportáveis da geração Y, ou qualquer letra que seja. Estamos falando daqueles que estão impacientes, que não conseguem manter o foco numa coisa só por muito tempo, que querem pensar a curto prazo, que querem ver a ação. Assim como as empresas que são flexíveis e se ajustam à demanda do mercado, ou seja, aos desejos das pessoas, são exatamente as empresas que irão sobreviver aos ciclos de crises cada vez mais curtos e constantes que a nova economia irá estabelecer. Para se manter no mercado, será necessário estabelecer-se como inovador por excelência. A grande questão é quem estará mais aberto a pensar "fora da caixa": nós, que aqui estamos e por vós esperamos? Será que existem vantagens ou desvantagens entre o modo de pensar e agir ocidental / oriental? Ou "ser inovador" é uma característica pessoal e intransferível? Steve Jobs conseguiu formar substitutos a longo prazo? Pois o antigo imperador chinês levou consigo todo o destino de um país e do mundo, que hoje teria olhos puxados.

09/07/2012

O Tempero dos 30

Estou chegando aos 30. E não sei até agora onde foi parar meu medo das rugas, meu horror aos cabelos brancos, os tais arrepios de frente para o espelho. Ainda não entrei em pânico pelos motivos que convém, ou deveriam, a uma "garota de quase 30". Sim, pulei algumas etapas antes dos 30 e por isso já estou escolada em assuntos como casamento, divórcio, perda e reparação. A verdade é que as mulheres de hoje deveriam se dar o direito de errar mais, antes dos tais decisivos 30. Afinal, só provando o sabor é que se sabe se o amargo realmente não lhe cai bem. Quem é que disse que não gosto de pimenta? E não tem gente que chupa limão?

Eu nasci para o sal, mas pouco temperado. E de vez em quando, o agridoce. É o que me cai bem, é o gosto que combina com meu paladar. Não sei viver de outra forma. E por isso talvez eu tenha alcançado os 30 já consciente de algumas pedrinhas de sal grosso que a vida nos empurra. Não que eu não tenha experimentado a pimenta - mas sei que não me cai bem. E o azedo, esse nunca me apeteceu, não precisei cair nesse buraco para saber que ele era fundo. Mas quanto àquelas pedras de sal, esperei cada uma delas se derreter, de um jeito ou de outro: na minha boca, na umidade do tempo, na chuva, na água. Aos 30, você já sabe como reagir. 

Mas a questão é que não cheguei aqui com o peso do sal, mas sim com a sensação de um grande mar dentro do peito. E por mais que eu já tenha uma certa intuição sobre meu destino, não acho que salgar esse peixe seja assim uma ideia tão ruim. A vida me parece curta demais quando penso que já gastei 30 fichas em apostas das quais mal me lembro, que só tenho certeza de que vivi quando olho para as fotos, diários e cartas. Que memória fraca! Para o bem e para o mal! Sem rancores, meu amor. Sem rancores antes, sem rancores depois - leve, como o sal ao vento. 

Eu espero que meus próximos 30 sejam merecidos. Sejam do tamanho exato que preciso para viver o que me cabe, do jeito que tem que ser vivido: com intensidade, com força, com vontade. Que aos 40 eu ainda me sinta com 26, como me sinto hoje com 23. E que aos 50, se eu tiver coragem para fazer uma cirurgia plástica e disfarçar umas rugas, eu me sinta com 30, por dentro, não por fora. Afinal, ainda vale a pena tirar as rugas para evitar as fofocas que o espelho espalha. Maldito seja! E que aos 60 eu me pareça com minha mãe, com a sorte de que tomei menos sol do que ela (fato), com uma energia insuportável para acordar cedo enquanto eu aos 30 simplesmente quero ficar na cama até mais tarde. E que aos 70, 80, quiçá 100, eu me sinta uma vitrola, rodando, ainda que cambaleando, rindo da vida, mas tocando sempre. 

Ah, a morte. Quem é que te disse que a gente só morre quando envelhece, meu amor? A gente morre todo dia, mais um pouquinho... Enquanto você desperdiça seu tempo, não vê que perde mais uma rodada do jogo... E fica aí, se lamuriando porque tem "30". Que diferença faz? Quem é que te disse que seu contrato não vence amanhã? Quem é que te garante que você não está condenado a ser o último dos seus amigos a partir, a ver todos irem embora, um a um? Lembre do que falei, meu amor - sem rancores, sem rancores. É a regra da vida, goste você ou não deste tempero. Só não espere que a vida seja doce demais: enjoa!



09/05/2012

Post do Futuro (Trágico)

Ano: 2112. 
Onde: Ao seu redor. 

Parágrafo 1. Das Comunicações.
As pessoas estarão conectadas por campos invisíveis (talvez azuis, para quem ainda insistir na corrente sobre vibrações energéticas, ou acinzentadas, para quem tiver um desvio numa região específica do cérebro que hoje não conhecemos). A liberdade de pensamento estará restrita a campos de assuntos pessoais, devidamente separados por tópicos em um filtro robotizado instalado assim que nascemos. Sim, os campos são biológicos, mas ainda assim precisaremos de um filtro automatizado que a natureza nunca nos proverá. Quando o assunto se tratar do bem de todos (e talvez o bem geral da nação), seu pensamento será automaticamente compartilhado, desmascarando quem você esconde na caixinha. A Terra será uma grande rede social da sinceridade, onde finalmente todos dirão o que pensam, claro, se forem pobres. Pois os ricos terão a opção de adquirir a liberdade de pensamento, que no caso é a restrição do pensamento: terá o poder quem puder dividir somente o que quer, o que deseja, sem ser espionado, invadido, hackeado. Ou seja, nasceremos todos com campos mórficos igualmente distribuídos em poder, atitude e alcance, mas mais uma vez a seleção natural das espécies ditará quais serão as vozes ouvidas (por bem ou por mal).

Parágrafo 2. Da Saúde.
A humanidade se verá cercada pelo dilema criado ao longo do sacrifício capitalista: tornou-se tão caro manter a vida no próprio planeta que manter a continuidade de sua linhagem será também uma escolha daqueles que detiverem esta opção em suas poupanças. Não apenas as guerras e moléstias mundiais selecionarão as populações remanescentes. A mão de obra crescente em 2012 em países como Índia, China e Brasil será consideravelmente diminuída pelo arroxo econômico: não há espaço, nem dinheiro para custear tanta gente. A vida será freada, reduzindo a variabilidade genética mundial. Em paralelo, algumas doenças serão potencializadas pela menor chance de recombinação genética para fortalecer a espécie. Na margem oposta, remando contra a maré, as terapias genéticas e estudos sobre o DNA (especialmente o RNA) irão alavancar a seleção natural na ponta das agulhas: somente os embriões mais capazes de sobreviver e manter a espécie neste território eternamente inóspito permanecerão. Cada pessoa nascida em 2112 terá sido selecionada por seu perfil genético, potencial habilidade, provável aptidão e vantagens biológicas. Uma competição já anunciada no berçário. As células tronco serão registradas como sua verdadeira e única identidade, compondo um novo formato de identificação. 

Parágrafo 3. Dos Relacionamentos.
Não existirão relacionamentos fundamentados na troca de sentimentos. Os relacionamentos serão definidos pela capacidade de troca harmoniosa e boa convivência entre os pares. O conceito de homossexualismo deixará de ser pré-concebido como absurdo, uma vez que os pares terão como finalidade apenas se proporcionarem maior segurança de vida, bom relacionamento em sociedade, amparo social e econômico, estabilidade emocional e parceria. Neste sentido, o conceito de paternidade e maternidade será adaptado ao caráter educacional, e menos sexual e biológico. A gestação in loco (natural) será opcional, apesar de pouco recomendada em função dos riscos oferecidos à mãe, mas o material genético dos pais será previamente selecionado num banco de DNA, eliminando os trechos eventualmente "desconexos" (fracos), para garantir a melhor ninhada possível e permitir a seleção dos gametas potencialmente propícios à reprodução da espécie. Portanto, além da função social, os relacionamentos terão como premissa a manutenção da evolução da espécie quando se trata de garantir a seleção dos embriões, providenciar a educação dos espécimes gerados e garantir que os mesmos tenham capacidade de se estruturarem na nova sociedade conforme os padrões estabelecidos. 

Parágrafo 4. Do Orgasmo.
Tratando de um mecanismo biológico regulador do estresse animal, o orgasmo será tratado como terapia metabológica contínua para todos os seres humanos a partir da idade reprodutiva, porém sem interrupção na idade avançada (exceto por casos específicos de saúde). Em função da modificação da função do relacionamento e das novas medidas de saúde pública adotadas (tratamento rigoroso contra doenças endêmicas como AIDS e outras transmitidas pelo sexo, além da redução dos problemas sociais decorrentes do aumento de divórcios no século anterior por motivo de traição ou troca de cônjuges), o sexo não será estimulado como prática para reprodução nem para o prazer, nem será entendido como base do relacionamento acima descrito. O sexo será entendido como componente de medicação diária através da aplicação prescrita de doses de determinados medicamentos e uso de equipamentos conectados ao cérebro para estimular as regiões dedicadas ao prazer, uma vez que a identificação das demandas individuais permitiu a resolução de problemas de ordem social antes incuráveis, tais como: agressividade, obesidade, depressão, transtornos obsessivos, violência, dentre outros. Desta forma, durante a puberdade, será iniciado um tratamento que medicará os pacientes conforme a demanda de seu organismo e sua mente, recomendando a dose de prazer a ser injetada no seu cérebro de acordo com seu estado metabólico e psicológico, eliminando a função da segunda pessoa na sensação antes vinculada ao relacionamento. 

Mas alegrem-se... Segundo as previsões, uma pequena fatia da sociedade, entendida como os novos hippies, insistirão em subverter o mecanismo e iniciarão um grupo de estudo sobre o sexo entre seres humanos por volta de 2140. 

Parágrafo 5. Do Conhecimento. 
As pessoas serão educadas e trabalharão em suas próprias residências, conectadas através de redes virtuais, eliminando problemas de trânsito, poluição sonora, redução definitiva do uso de combustíveis fósseis, etc. Todo e qualquer deslocamento físico será realizado única e exclusivamente por diversão, dedicando-se ao ato de conhecer outros lugares e pessoas presencialmente. A vivência presencial será a grande diversão da nova era, saindo do mundo "touch" das telas para o mundo ao toque real. Criar as experiências do mundo antigo transformará o mundo do entretenimento numa grande volta ao passado, criando nas pessoas a sensação do absurdo diante dos desperdícios e abusos, mas também se sensações nunca antes vivenciadas por estarem agora restritas aos seus metros quadrados. Toda e qualquer distribuição de produtos e serviços será feita por uma rede conectada às residências, que já estarão preparadas para fornecer a estrutura de sobrevivência aos novos seres humanos. Somente serviços essenciais muito especializados exigirão o deslocamento das próprias pessoas, tais como: parto natural, operações cirúrgicas de grande porte, etc. Toda a estrutura de moradia, transporte, saúde pública, produção de bens, prestação de serviços será modificada ao longo do século para suportar uma nova plataforma onde as pessoas serão clientes do sistema. E todos serão vigiados para garantir a ordem. 

Mas não ache que estou aqui pensando nisso tudo à toa. É que dentre tantas previsões alarmistas de alguns ambientalistas, depois de ficar meio assustada com o Big Brother de George Orwell e achar que a Matrix realmente existe, acho que o importante mesmo é ter capacidade de pensar sobre essas coisas. Rupert Sheldrake diria que "sua garotinha cresceu e anda lendo suas ideias". Aldous Huxley talvez dissesse que finalmente estou entendendo as coisas. Que finalmente entendi que não posso dizer tudo que penso para todos, mas sim somente para aqueles em quem confio. Pois a opinião nos revela. A opinião nos dedura. E a imaginação, diz o que? 



03/05/2012

Estratégia

Não se trata apenas da eterna mania de se discutir tabus. A questão é qualquer ideia pré-concebida me incomoda quando me parece conformista demais. Não quero engolir uma resposta qualquer porque aquela é a que era aceita pelos que vieram antes de mim. A verdade é tão flexível quanto o tempo. Gira como o ponteiro. Eu diria que a verdade é referencial, mas isso poderia ser usado contra mim por um advogado qualquer (desculpe, amiga, mas sua classe é foda). 

A questão é que fico encucada pensando em uma série de coisas que todo mundo insiste em não pensar. Eu já quebrei na minha cabeça o paradigma dos livros motivacionais de que para ser uma pessoa de sucesso você tem que ter planos maravilhosos para daqui há 5, 10 anos. Se você, meu querido, souber onde quer estar daqui há um ano, considere-se um cara de sorte diante deste mundo feito de primaveras árabes. Você já está pegando o boi. Mas não ter planos desenhados não significa que você não pode ter metas. Não misture alhos com bugalhos. Calma lá, que dá pra pra fazer uma farofa aí. Não se desespere, Geração Y ansiosa, medonha, chiliquenta! 

Planos exigem cronograma, passos, prazos, tudo traçadinho, bonitinho, já determinado pra amanhã, semana que vem. Vamos facilitar as coisas pra você, que tem a maior dificuldade do mundo de saber o que quer pra próxima refeição. Primeiro pense no que mais deseja para sua vida. O que você quer pra você. O que você espera do seu futuro, o que você sonha como uma vida ideal, sem pensar nos padrões de mercado - pense no que te satisfaz de verdade, no que lhe é realmente básico e de coração. Valem coisas pra vida pessoal, profissional, tudo. 

Passe dias pensando nisso. Vá anotando. Risque algumas idéias que aos poucos você vai notar que nem eram tão importantes. Afinal, você tem mesmo outras prioridades. E aquele velho sonho de infância, quem disse que não pode entrar na lista? Vale, vale sim. Não dá pra esconder quem você é de sim mesmo. Dá pra ser palhaço e sobreviver - que tal o Cirque du Soleil? Dá pra ser mãe - mesmo que seja solteira! Nem todos os seus sonhos vão ser perfeitinhos, feitos de silicone e tinta. Você vai ter que aceitar isso. Esse é o segundo passo. 

Dessas ideias que você anotou, separe aquelas que você entende como metas de vida. O que é fundamental pra você se sentir realizando um objetivo de vida? O que te faz sentir uma pessoa realizada de fato? Selecione o que é prioridade, foque suas energias naquilo que merece atenção. E aí comece a encarar como gente grande: seja realista, seja verdadeiro, pense no que dá pra fazer de verdade ou como pode ajeitar as coisas pra conseguir uma parte daquilo. Não desanime quando perceber que os sonhos podem ser diluídos como homeopatia... Porque ainda dá pra sonhar mesmo com poucas gotas do que resta! 

E do que sobrar, faça grandes placas mentais, brilhantes, luminosas, piscando: "eu posso, eu quero, eu vou, porque só depende de mim". Isso não é papo de auto-ajuda, é coisa que eu já vivi. E vivo todo santo dia. E a cada milagrezinho que acontece, descubro que a placa iluminada me ajuda a manter o foco, a manter a vontade firme, a não esmorecer diante das durezas da vida. Cada um vai ter um sonho, uma meta, proporcional ao seu mundo, proporcional ao seu carma, isso é fato. Resta-nos saber correr atrás do que nos cabe viver nesta vida, aproveitando ao máximo cada oportunidade concedida. Agora, se você ficar aí, esperando que alguém te diga pra onde você tem que ir, quais são os seus sonhos, sinto muito. A estrada é só sua. 


03/04/2012

Do que se fala

Quando sua cabeça não responde mais naquela velocidade habitual, você se pergunta se precisa mesmo estar sempre a mil por hora ou se estava apenas habituada a conseguir fazer mais do que a média dos seres comuns. Não é uma questão de se supervalorizar, de se achar mais produtivo do que a média. Fato é que talvez me sentir assim, nessa nuvem invisível, nesse ritmo de gelatina, me deixa meio sem norte. Não estou acostumada a deixar que tudo ande mais devagar, ou que tudo ande num ritmo saudável. Depende do que você considera saudável.

Talvez meu organismo de um modo geral entendesse que eu precisava de um freio... E que as enxaquecas nada mais fossem do que um sinal de que era hora de parar, de vez. Apesar de minha cabeça dizer, querer e sempre pensar ao contrário: posso mais, quero mais, dá pra fazer mais. Mesmo que o corpo não suportasse o mesmo ritmo. Maldita cabeça que corre mais que o tempo, mais que o sangue, mais que a própria alma.

Fato é que deixei de ser um pouco eu. E olha que muitos ainda se espantam com meus surtos de eletricidade... Ah, se me conhecessem nos meus verdadeiros momentos elétricos quase constantes... Agora tenho poucos flashes, que preciso esgotar enquanto duram antes que se evaporem. Antes eu era movida por estas ondas magnéticas malucas, sempre ligada naquela tomada, e talvez por isso o organismo tenha dito: pare, porque não adianta correr. Mas a questão é que correr me deixa feliz, me motiva, me satisfaz. E ficar assim, morninha, mosquinha morta, paradinha, me transforma em mais uma: uma qualquer.

Difícil aceitar essa onda de mesmice. Difícil também reconhecer que não sou modesta assim, tão descaradamente. Não estou acostumada com esse ritmo ditado pela vida. Sempre ditei a música que tocou... E agora me resta dançar o que estiver tocando... O problema é que a sensação que eu tenho é que se tocar um rock, não vou estar pronta. Vou estar tão acostumada com a música lenta que vou esquecer como é que se dança... E vou me acostumar a ficar assim, sem sal, sem graça, palerma, desconectada.

Não sou eu, resumindo. Tem um prazo pra tudo isso acabar, teoricamente. Mas será que quando o remédio for embora, vou mesmo voltar ao meu normal ou vou ter me habituado a ser assim? Vou ter remodelado minhas conexões neurais, desentopindo as glias cheias de cálcio e agora entopindo dessa preguicite aguda que me deixa enjoada de mim mesma? Quem sou eu sem o meu acúmulo de cálcio distorcendo meu jeito de ser? Será que tudo vai mudar tanto ou que pelo menos vou recuperar minha energia?

Eu me preocupo, claro. Pois não se trata apenas da energia para trabalhar, para cair na farra, pra agir, pra querer algo. Trata-se da energia pra ser eu mesma, pra me irritar, pra me motivar, pra me tirar na inércia, pra me fazer reagir às rupturas que sempre mudam meu rumo. É a minha energia que me assegura meu poder de sobreviver, de reagir, de tomar uma atitude. A questão em jogo é o meu instinto. A questão é a minha espécie.

27/02/2012

O Tédio

O Tédio. Devo ser da geração T, de tédio. T de exigente constante tesão por tudo. Aprender que a vida não é 100% aventura é quase tão difícil quanto entender que o número do Pi é uma dízima periódica. Aceite, a vida é 99% do tempo batalha para viver 1% do sonho que nem te pertence. Eis a questão. Não me conformo com esse T de “tantinho”, esse pouco que nada vale diante de tantas possibilidades. O problema do Tédio é que ele corrói quem é ansioso por viver, por sorver a vida em seu princípio básico: ela tem fim. E se tem fim, quanto mais você se conforma, mais perde tempo. Ou melhor, Tempo.
 
E não dá pra pensar que perder Tempo é passível de correção - que minuto se resgata, que hora se recupera, que dia se retoma. Você pode até aprender dali pra frente, mas o minuto que aqui estou perdendo, entediada, resmungando, esse Tempo eu já perdi na batalha cega contra esse monstro. E você também, pois sendo de carne e osso como eu, mero mortal encarnado em suas funções de gente, está provavelmente trabalhando, cuidando de sua vida, e não sonhando com ela, muito menos gastando todo o seu tempo vivendo sonhos. Pois até viver de sonhos um dia cai no Tédio.
 
Ah, maldito ser humano que não se contenta! Um “contentar descontente”, alguém já disse, depois de já saber que o Tédio não discrimina. Você se entedia de qualquer coisa, por melhor que ela seja? Não se preocupe, talvez você seja só humano, insatisfeito e inconformado. Não se trata de ser infeliz! É apenas uma questão de sempre achar que tudo pode ser mais intenso, mais emocionante, mais tela de cinema. A gente quer viver uma novela, mas sem dramas, só com grandes sentimentos, grandes ideias, achando que a mesmice é desprezível e cabível aos comerciais e horários políticos.
 
Santa ignorância! Se nos entediamos até quando vivemos de sonhos, até a vida sonhada se transformaria em mesmice e cairíamos no mesmo paradoxo do Tédio. Estamos condenados. Portanto, que bom que a mesmice que temos ao nosso alcance é barata e ainda nos dá a chance de pequenos luxos e prazeres que nenhum outro ser vivo tem direito: família, trabalho, educação, fé, amizade, conceito de futuro. A nossa mesmice, tão reclamada, ainda é a melhor condição que a natureza propusera quando nos fez seres inteligentes: ainda bem que não vivemos enlouquecidos numa vida de aventuras constantes!
 
A verdade é que o Tédio, nem é tão malvado assim. Ele te sacode, te move, te acorda. Te incomoda. E por mais que ele pareça querer te engolir, na verdade está te soprando pra bem longe, dizendo que você precisa aprender a dar valor aos dias pacíficos, aos sonhos que se permite e ao poder que tem para realizá-los. Pois acredite: sonhar muitas vezes demanda mais esforço, gera mais felicidade e causa mais benefícios do que viver o sonho de fato. Não se mate quando estiver entediado. Vai passar.
 

24/02/2012

O mestre

"O verdadeiro poder e a verdadeira autoridade não é exercer poder e autoridade sobre os outros, mas sobre si mesmo. Entender essa simples verdade é entrar no processo de se tornar um mestre de si. Mais do que tentar controlar os outros, eu começo a perceber que sou capaz de controlar meus próprios impulsos, hábitos, pensamentos e reações."
 
 

23/02/2012

Infância bem vivida

Quando eu era criança, mas nem tão pequena assim, me divertia na caixa d´água do prédio em que eu morava nos dias em que tínhamos que lavar a bendita. Até hoje não sei como minha mãe tinha coragem de nos deixar nadar naquele lugar, beirando o topo do prédio. Adulta que sou hoje, não sei se eu ia achar tão natural ficar rodeando aquela beirada como se fosse a dois palmos do chão. Deus, como já estivemos imperceptivelmente expostos ao risco! E só isso me incomoda quando tenho essa memória hoje. Não penso na época de vacas magras, nem de diversões aparentemente mixurucas, muito menos na suposta ausência de luxo ao se divertir na caixa d´água do prédio. Por sinal, eu era bem mais corajosa do que talvez eu seja hoje!
 
Naqueles tempos, subíamos no teto do terraço sem pensar na altura a que estávamos expostos. Não interessava a que distância estava o chão. Só nos interessava o quanto estávamos mais próximos do céu azul, que nos esperava para mais uma de nossas aventuras, fossem elas imaginárias ou reais. Podíamos nos divertir às custas de uma simples pipa, feita do papel mais barato, ou de mundos criados daquela matéria-prima que o dinheiro não compra e nem manda buscar. Viajávamos em nossa nave espacial feita de cacos recolhidos na rua, lixo reciclado em sua mais pura essência, convertido em brinquedo clássico. Paredes pintadas de azul e amarelo, restos de tinta aproveitados e sem permissão, indicando computadores que já eram holográficos em nossas ideias.
 
De cabos de vassoura convertidos em espadas e bastões, de placas de madeira convertidas em escudos e armadura, a portões imaginários, passagens secretas pelo espaço, civilizações inteiras esperando por nós em outros planetas, poderes concedidos a cavaleiros nomeados por constelações. A gente não tinha medo de altura! A verdade é que a gente não tinha medo de nada, de monstro algum, de lugar algum, de risco algum, de qualquer desafio - a gente nem sequer tinha medo do futuro. Éramos mais criativos, mais corajosos, mais honrados (provavelmente) e mais leais aos nossos propósitos. Só queríamos viver aquela aventura, mesmo que durasse apenas uma rápida tarde de sol, num terraço de um prédio numa cidade do interior, sem muitos recursos. Ainda assim, éramos gigantes.
 
E talvez por isso nós sejamos quem somos hoje, cada um em seu canto, seguindo sua vida já saciados de sua quota de aventuras descabidas. Fato é que não somos mais aqueles heróis com nomes folclóricos, guerreando para proteger povos e terras. Somos heróis de nossa rotina, real, de pés no chão, seguindo nossos rumos tão diferentes de nossas antigas funções naquela nave espacial. Talvez tudo tenha servido para nos ensinar a valorizar o que temos hoje em nossas mãos, o que alcançamos através de nossos esforços, a cada passo. Não chegamos aonde estamos por sorte ou acaso. Tivemos nossa parcela de trabalho e culpa. Fizemos por onde. Talvez isso explique como eu me sinto em casa mesmo estando diante de coisas tão magníficas... porque eu já as conheço de viagens anteriores, daqueles tempos, em que eu apenas sonhava com aquilo, acordava naquele terraço, mas já decorando cada pedacinho do que estava por vir.
 

09/01/2012

Sua trança

A vida é um emaranhado de universos paralelos. Segundo Rayssa Constancio, talvez uma trança, com pelo menos 3 caminhos... Eu já acho que temos muito mais opções ao nosso dispor. A gente escolhe o que quer dentre mil possibilidades. Algumas delas te empurram um pouco pra trás, outras te trazem um atalho. Talvez você se depare com um único caminho lá no fim, e descubra que de qualquer jeito, tinha que chegar lá. Ou pode ser que você aprenda a escolher não o caminho certo, perante a lógica, mas sim o caminho que te faz mais feliz. Desejo que você tenha essa sorte.
Eu SEMPRE me deparei com essa constatação.
Quando era criança, assisti um filme em que uma mulher tinha uma doença misteriosa, com uma mancha em forma de borboleta. Não me lembro do nome do filme, nem em que ano foi. Fato é que na infância, sofri anos por causa do reumatismo infantil. Anos depois, descobrimos que era uma outra doença, mascarada pelo organismo ainda em desenvolvimento. Os hormônios e o estresse chegaram, trazendo o lúpus cutâneo. E daí? Daí que o primeiro sinal é a ferida / mancha em forma de borboleta no nariz e bochechas. Quando era criança, lia reportagens sobre o sistema imunológico do tubarão. Quer apostar que a cura do lúpus vai ter algo a ver com os grandes tubarões?
Quando eu era criança, escrevia jornais diários pra minha mãe. Li cada um deles como se fosse uma apresentadora... Escrevia sem parar... Anos depois, tentei Comunicação Social no vestibular... Não passei. Achou que a lei do destino tinha falhado? Pois te digo... No colégio, no último ano, me deparei com a propaganda de um novo curso. Ciência da Informação, o profissional do futuro, multidisciplinar. Fui fisgada. E foi este o curso que fiz. Meu primeiro estágio? 3 anos numa assessoria de imprensa... E o que descobri? Que seria uma jornalista frustrada: alguém cortando os meus textos? Desaforo!!! Não sei se seria mesmo o melhor caminho pra mim.
Quando era criança, via vários antigos programas do Jacques Cousteau. Queria ser oceanógrafa. Eu me desfiz desse plano por dois motivos: lúpus (avesso ao sol) e medo (coisas da idade de mudanças, receio de ir pra longe). Acabei caindo nas duas opções citadas acima. E quando me formei, fiz a minha primeira promessa para a vida toda: que todo ano eu estaria no mar, de qualquer jeito, de preferência mergulhando, em contato com aquele mundo azul e silencioso do Jacques. Promessa cumprida desde 2003. E sabe o que aconteceu? Estive em vários lugares que Cousteau também esteve: no cenote maia no México, no mar da Ilha de Páscoa, nas águas de Noronha e Arraial do Cabo. Falta muito, mas quando é que eu imaginaria que viveria essa realidade?
Quando eu era mais nova, imaginava como seriam meus irmãos. Não sabia como chegar até eles, inclusive sem me obrigar a uma convivência com meu pai. Na época, isso não era assunto discutido pra mim. Anos depois, via rede social, uma prima me ajudou a encontrar minha irmã. Por sorte (jura que é sorte?) eu adicionei a caçula, aberta, sem desconfiança, sem ciúmes e leonina. Se eu tivesse adicionado a mais velha (depois de mim), teria dado com a cara na parede e não teria resolvido esse dilema de tantos anos. Se tivesse adicionado meu irmão, teria rido do seu jeito caladão e pode ser que eu recuasse intimidada. Mas eu tropecei na pessoa certa e aqui estamos, ganhando espaço uma na vida da outra. E resolvendo velhos remorsos...
Eu bem que tentei estudar na Espanha, por volta de 2004. Era um mestrado de Gestão do Conhecimento e Comunicação Corporativa na PUC de Salamanca. Passei em todos os processos seletivos, mesmo sem saber nada de espanhol. Mas não consegui a bolsa do programa europeu. Porém, se eu tivesse aqueles 6 mil euros, teria feito o mestrado e seguido meu lado nerd de vez. Não tinha, claro. Mas eu tentei. E nunca deixei de gostar do tema... Anos depois, peguei um projeto chamado "Banco de Projetos" na empresa e tentei realizar um pouco do meu sonho... Criamos uma logomarca com o olho de Hórus, aquele que tudo vê. O projeto morreu na praia, mas eu coloquei a mão na massa. Mais uns anos e aqui estou eu participando de um projeto de uma rede social corporativa. Quais são os temas recorrentes? Gestão do conhecimento e comunicação corporativa. Destino? Não, bebê!
Se eu tivesse feito oceanografia, seria uma ambientalista frustrada diante do caos ambiental de hoje. Estaria em depressão pelo que fazem com nossos mares e florestas. Provavelmente estaria dedicada a alguma ONG, fissurada em golfinhos, baleias ou algo do tipo. Não teria muito dinheiro, pois o mundo capitalista é cruel. Quem se doa, não recebe tudo de volta. Não logo de cara. E daí, meu caro, que eu vim parar no lugar certo. Conheço 3 unidades do ICMBio. Mergulhei várias vezes. Faço meu ambientalismo em pequenos gestos em redes sociais e alguns discursos meio descascados. E ainda assim tenho meu teto, tenho meus sonhos e viajo pelo mundo porque dou um jeito. Não estou colada num pedaço de terra. Sou do mundo que eu sempre quis ver de perto.
Eu nunca sequer imaginei que eu fosse me casar. Não estava nos meus planos. Aconteceu, claro, sempre do meu jeito: a jato. Sem titubear, sem duvidar de que aquilo era o certo. Foi certo enquanto durou. Só doeu (muito) no fim, mas eu não me arrependo. Onde está o destino? Um dia procure saber o que eu dizia pra minha mãe quando era criança: "vou me casar com um branquelo do cabelo preto, quando eu tiver X anos". Deixei de ir pra França pra apresentar um artigo sobre mapas conceituais... Mas esse mesmo dinheiro, que usei pra outros fins, depois virou um crédito de aluguel... E em meio aos tempos turbulentos, eu fui pra Abrolhos. O preço de um sonho. E você quer mesmo que eu diga que não valeu a pena? Valeu. E era pra eu estar lá, contando 25 baleias jubarte.
Posso citar muitas coisas como essas... Perco as contas de quantas vezes eu escolhi um caminho, mas cheguei ao mesmo resultado. Ou quantas vezes direcionei minhas forças pra um rumo, fui obrigada a mudar de ventos, e mesmo assim encontrei o que buscava. A gente se adequa à vida, desde que você se permita confiar nas possibilidades que o futuro te oferece. Somos flexíveis, como a água. Somos feitos de 2/3 de água, não se esqueça. Voltando ao que a Rayssa disse... O destino não é uma trança com 3 escolhas. O destino é uma trança com milhares de fios.