22/04/2015

Os Ciclos

Há quem acredite que tudo é para sempre, mas nossas experiências são tão finitas quanto nossa existência. De alguma forma, tudo se transforma e a ideia inicial sempre se perde no tempo. A gente se esquece do quanto é importante que os ciclos se fechem, para que novos se iniciem. O doce cheiro do novo, do inesperado, da ausência de certezas que abre uma imensidão de possibilidades. Ciclos que se fecham são libertadores, permitem novas perspectivas, permitem oportunidades.

Sempre me incomodei com coisas sem fim, mal resolvidas, mal explicadas. Histórias sem fim, livros que não terminei, conversas interrompidas, sonhos mal encaminhados, mal entendidos. Essa coisa de deixar para depois, de não dizer o que deveria ser dito, de engolir sapos sem questionar, de deixar o outro partir sem saber o motivo. Mas apesar do meu incômodo, aprendi que o tempo também resolve por si só uma série de questões que não estão no nosso alcance. 

Afinal, ter poder e controle sobre as questões mal resolvidas dos outros não está na nossa alçada. Envolve o outro querer, tomar atitude e fazer a sua parte. Daí que o tempo tem uma grande vantagem nestes casos: mesmo que o outro não se resolva, não queira resolver, o tempo permite que você resolva a sua parte, que você seja responsável somente por aquilo que lhe compete de fato. O ciclo se encerra para você, eliminando velhos pesos, libertando-se do rancor, do passado ou da história que não mais lhe pertence. 

Talvez não tenhamos sido criados para entender a finitude de tudo. Da vida, das relações, das experiências. Bom mesmo seria nascer calejado de ciclos - conscientes de que tudo que se vai, cede espaço para o que ainda está por vir. Somos ocidentais demais nesse aspecto... Medo do fim, medo do fracasso, medo do erro. Falta a gente dar a cara a tapa sem ter medo de recomeçar quando necessário. 

Desejo que todos passem por muitos fins, para viverem novos recomeços. Recomeços são apaixonantes, são motivadores, são cativantes. Recomeços são um exercício da nossa própria humanidade, desde que estejamos conscientes da oportunidade ali escondida. E que entre os recomeços, todos se encontrem! Talvez por isso os círculos sejam formas tão perfeitas: por serem retas tortas com o devido destino. Onde o fim é sempre um início. E hoje fechei mais um ciclo, em paz. 

Recomece, todo santo dia! :)


04/01/2015

Viagem ao meu tempo com Darwin

Há exatamente dois meses eu parti. E mais uma vez eu voltei uma pessoa diferente de quem eu era. A essência permanece a mesma, claro, mas o ângulo sempre muda. Quando você se permite ir, nunca retorna como foi. Não poderia voltar ilesa de Galápagos e eu já estava ciente de que um preço seria cobrado por isso. O grande problema de viajar, é que você cada vez mais tem certeza de que precisa sempre estar "lá", onde quer que seja, e nunca mais estará satisfeito permanecendo sempre no mesmo lugar.
Talvez seja o apego à lei da física quanto a viajar pelo tempo. Você finalmente entende que tempo é o único conceito que dita toda a sua vida. Você descobre que pode voltar ao passado ou voar para o futuro quando muda de fuso horário. E se sente por algumas horas no comando do tempo curto que é de sua responsabilidade nesta vida.
Conhecer Galápagos estava no plano há anos e ganhou força em 2009, quando precisei me reconstruir. E nada mais justo do que a vida me permitir a concretização do sonho quando novamente eu precisei reencontrar meu eixo. Estar em Galápagos tem a ver com recarregar a bateria, tomar fôlego, pegar impulso pro que ainda está por vir. Tem a ver com o resgate da força que dispendi em vão, e que agora deveria focar em mim, por uma questão de sobrevivência. Precisei de dois meses e uma virada de ano pra aceitar tudo isso.
Já dizia Darwin que sobrevive quem melhor se adapta, e não o mais forte. Deus, como isso se aplica a mim! Precisei esticar meu pescoço várias vezes pra voltar a respirar, precisei engolir muita casca grossa pra me manter de pé, precisei aguentar a água salgada para me adaptar. 2014 foi um ano do exercício da resiliência, tentando aceitar que nem tudo está no meu controle e que ainda assim eu posso também ser mais flexível. Desde que isso não afete a minha essência. Fato é que não tenho mais certeza em que realmente sou "boa", sendo que antes já me julguei a "melhor" em algumas áreas. Perdi certezas para ganhar flexibilidade.
Descobri que tenho sérios problemas em diferenciar boas e más pessoas. Descobri também que não sou a mais egoísta de todas as pessoas que conheço. Descobri que podemos ser melhores se simplesmente ouvirmos o outro lado. Descobri que ouvir demais o outro, sem nos ouvirmos, também não adianta. Descobri que desde que aprendi a chorar aos 26 anos, carrego só o peso que me cabe. Descobri que não sei me sentir culpada. Descobri que não sei dormir com raiva. Descobri que ainda preciso trabalhar minha ansiedade diante da mudança, coisa que eu pensava que já tinha domado. Descobri que ter uma vida leve é o que me cabe, mesmo que isso me leve a ficar sozinha por um bom tempo. Não está só nas minhas mãos. E o que tiver que ser, será.
Darwin estava certo quando disse que sobrevive quem melhor se adapta. Nestes meus 32 anos de muitos diários engavetados, descobri que quanto menos eu escrevi e menos me ensimesmei quanto aos meus questionamentos, menor a importância que dei a eles, tornando-os irrelevantes diante de todo um contexto maior. Afinal, algumas questões é melhor deixar que o tempo resolva, sem você se obrigar a algum tipo de atitude. Não se trata de negar o que te incomoda, mas simplesmente de lhe dar a devida importância perante tudo que ainda está por vir.
Eu realmente queria poder explicar como estar em Galápagos apenas reafirmou tudo que acabei de mencionar, mas ainda assim nada que eu escrever hoje será tão fidedigno ao que pensei em cada instante lá. Você descobre que não tem medo de iguanas marinhas e que pode nadar junto com elas, mudando seu conceito de beleza e risco. Você descobre que tem mais medo de leão marinho do que imaginava, mudando a percepção da coragem que julgava carregar. Você se encanta não só com os grandes pelicanos, mas especialmente com os pequenos tentilhões, miúdos, simplórios e graciosos, trazendo seu coração de volta às pequenas alegrias. Você flutua diante de várias tintoreras (tubarões de galha branca) como se observasse toda a vida, intocável, compreendendo como é preciso respeitar o espaço de cada um. Você entende que às vezes você precisa desacelerar para viver mais o momento, no mesmo ritmo das tartarugas gigantes centenárias, economizando energia para o que realmente vai valer a pena. Você engole o choro quando encontra os tão sonhados pinguins, que te moveram durante meses rumo àquela escolha, que seguraram a sua onda quando outras esferas da vida te deixavam sem esperança.
Hoje mesmo também li sobre a dificuldade de endurecer sem perder a ternura. Há alguns anos me disseram que eu tinha me tornado uma pessoa dura (adaptada?) e mais arrogante (adaptada?). Confesso que meu medo era mesmo eu ter deixado de ser quem eu era, ou quem sempre me disseram que eu era: leve, alegre, otimista. Tudo que vi e senti em Galápagos me trouxeram a tranquilidade de dizer que não perdi a ternura (adaptada?) e que cada vez mais adoto duas posturas: minimizar o poder que as ações alheias negativas têm sobre mim (adaptada?) e potencializar a minha capacidade de ser sincera quanto ao que sinto, sem máscaras (adaptada?). Afinal, não sei quanto tempo me resta aqui, nem o que ainda está por vir. Quando se viaja, a gente aprende que não importa somente o destino, mas especialmente o caminho até lá. Enquanto isso, o que posso fazer é driblar os fusos da vida, fazendo planos quando possível e seguindo a maré quando ela me chamar. Resiliência, resiliência!

Trilha sonora da viagem:
- Lilly Wood & the Prick and Robin Schulz - Prayer In C
- Nico feat Vinz - Am I Wrong


Se alguém quiser dicas sobre Galápagos, estou às ordens!

03/11/2014

Antes de Partir

Porque quando você parte, nunca se sabe o que vem a seguir. A vida refaz os caminhos e quando você menos percebe, não voltou de lá. Quando você parte, você nunca mais retorna ao que era antes. Quando você parte, algo muda na ordem da vida. Aquele velho papo de que uma mente que se abre a uma ideia nunca mais volta ao seu antigo tamanho, ou que uma janela que se abre nunca mais aceita se fechar, ou que quando se conhecesse a vastidão mundo nunca mais deixa de querer o universo. 

Optar por partir faz parte do exercício para o qual somos tão pouco preparados. Crescemos com medo de despedidas, da saudade, dos términos e da morte. E pouco entendemos sobre a importância desses episódios na consolidação da nossa própria humanidade. Partir e deixar ir faz parte da nossa natureza como seres racionais, donos da nossa própria vontade. 

Há muitos anos venho tentando exercitar a minha compreensão das partidas, das rupturas, das mudanças. E por bem ou por mal, toda a sequencia de fatos da minha vida vem me cobrando resiliência diante destas partidas, minhas ou de outrem. Porém, quando é você quem opta por partir, opta por se desconectar por algum tempo de tudo que é parte da sua essência, você finalmente entende: que você basta a si mesmo. Que sua existência não depende de nada, além de você mesmo, por mais egocêntrico que isso pareça. 

E talvez pensando assim, sem cobrar que o outro te abasteça de qualquer coisa que você julga ser indispensável, você consiga de fato aceitar mais as pessoas, os fatos e o destino tal como eles realmente são. Sem esperar que as pessoas nunca partam, aceitando que você mesmo um dia pode partir. 

Entretanto, a sua existência independente não o blinda da existência alheia. É fundamental diferenciar as duas ideias. Quando você aceita que tudo é passageiro e que a partida ou despedida será necessária, você entende que sua vida não acaba quando uma outra vida se "desliga" da sua. Mas nem por isso as vidas relacionadas à sua existência deixam de moldar a pessoa que você é. Sendo assim, o conceito básico é que: você é o seu próprio mundo, mas nem por isso ele não será habitado.

E daí que os inquilinos um dia se mudam, ou você repassa o seu "imóvel". Você também muda, você também escolhe ir embora. Você também escolhe outros inquilinos. E no final das contas, cada experiência moldou o caminho da sua partida. Afinal, quando você parte, ainda assim nunca se sabe o que vem a seguir. 

Nó sem Fim: Um dos símbolos do budismo tibetano que representa a visão budista de que tudo o que existe está interconectado. 


22/10/2014

O tempo certo de todas as coisas

Tenho um coração de jumento.
Faço escolhas erradas quanto ao amor.
Fato.
E vim aqui compartilhar algumas coisas que aprendi até aqui.
Você pode ser inteligente e aprender pelos meus erros.
Ou pode viver os seus erros e ser feliz assim.
1) Nunca namore/continue com alguém porque se sente só. Ou pior: porque tem medo de se sentir só. Nada pior do que a solidão mesmo acompanhada, pois não completa e não trata a causa real do problema. Você perde tempo ao lado da pessoa errada.
2) Nunca namore/continue com alguém que acha que sua vida é "fácil", que você não tem problemas. Nada pior do que uma pessoa egoísta ao ponto de comparar os seus problemas com os de qualquer outra pessoa no mundo, pois só você sabe o peso real dos seus problemas. Você perde tempo ao lado da pessoa que só enxerga um umbigo: o dela/dele.
3) Nunca namore/continue com alguém esperando que essa pessoa mude por você. Nada pior do que uma pessoa ser forçada a ser o que não é. Nada pior do que essa pessoa também esperar que você se transforme naquilo que você nunca quis ser. Ceder e se anular são coisas diferentes. Em nenhuma hipótese mude pelo outro, mude se você achar que é a sua hora de agir diferente, por você. Você perde tempo ao lado de uma pessoa que espera que você seja outra - especialmente se for um tipo de pessoa que você não admira ou que venha a ter hábitos que não condizem com o seu conceito de felicidade.
4) Nunca namore/continue com alguém por pena, especialmente por pensar que você deve ser um companheiro/companheira das horas ruins inquestionavelmente. A pessoa deve aprender a separar os seus problemas dos seus momentos juntos, blindando a relação e fazendo valer a pena o que a vida ainda oferece de positivo. Você perde tempo ao lado de uma pessoa que é digna de pena, pois a verdadeira compaixão é também permitir que a pessoa siga um rumo sem você e que você também busque a felicidade.
5) Nunca namore/continue com alguém que não tenha saído de outros relacionamentos de forma honesta e íntegra. Fraquezas todos temos, claro. Defeitos todos temos, claro. Mas a forma como a outra pessoa se desliga da outra, o tempo que ela se dá para recuperar o fôlego, é fundamental para conhecer a integridade daquela pessoa. Especialmente se a pessoa nunca soube "estar sozinha", pois isso indica uma pessoa que vive de muletas. E que usa o próximo para tampar suas feridas sem cultivar o amor próprio. Você perde tempo ao lado de quem usa os novos amores como refúgios para serem pessoas perfeitas.
6) Nunca namore/continue com alguém que não respeita seus amigos. O verdadeiro companheiro de toda uma vida não precisa estar sempre ao seu lado em todos os encontros com seus melhores amigos, mas deve cultivar a consideração por todos que são importantes em sua vida. E isso não inclui estar presente em todas as festas, mas sim em ter cuidado com a forma como trata aqueles que você ama. E se seus amigos levantarem um sinal de alerta sobre a pessoa, investigue, busque saber sobre a pessoa - o alarme dos seus amigos é infalível e eles sempre querem o seu bem. Você perde tempo ao lado de quem não trata bem aqueles que sempre estiveram ao seu lado.
7) Nunca namore/continue com alguém que tenta sempre interferir no seu relacionamento com sua família. Pois essa pessoa não conhece sua história e não sabe de todo o seu passado. Cabe a você definir os limites de seus familiares em sua vida e só porque a outra pessoa é dependente emocionalmente da família, não significa que você precisa ser. Cada um sabe como lidar com seus pais e irmãos, desde que exista respeito e amor. Você perde tempo com uma pessoa que critica suas relações, ao invés de olhar para o seu próprio cordão umbilical.
8) Nunca namore/continue com alguém que possui valores de vida extremamente diferentes dos seus, o que é bem diferente de serem "complementares". Toda relação precisa de equilíbrio e os valores de ambas as partes precisam ser respeitados e atendidos nas devidas medidas. Ninguém tem que abrir mão dos seus valores em função do questionamento do outro. Especialmente quando se trata de assuntos materiais e emocionais. A relação saudável exige congruência e satisfação, não eternas concessões. As pessoas se perdem quando só cedem. Você perde tempo focando em atender somente aos valores do outro, deixando seus planos e sonhos de lado.
9) Nunca namore/continue com alguém que se descontrola emocionalmente e tem picos de raiva de qualquer ser vivo no mundo. O descontrole emocional é um reflexo de uma pessoa alterada, instável. Toda pessoa merece respeito, assim como não se deve usar de violência especialmente em situações banais e estressantes da rotina. Você nunca vai saber quando você será o próximo alvo e nunca estará segura diante de uma pessoa desequilibrada. Você perde tempo ao lado de alguém que incita qualquer energia negativa, especialmente concretizando em ações violentas.
10) Nunca namore/continue com alguém que esconde segredos ou histórias sobre seu passado. Busque pessoas que são um livro aberto, sem medo de falar sobre relações antigas, sobre medos, sofre defeitos e sobre qualidades também. Busque pessoas que joguem limpo - o tipo de pessoa que você escolheria para ser seu melhor amigo. Pois o seu amor também precisa ser seu amigo todo santo dia. Você perde tempo quando se envolve por comodismo, por sexo, por status, por vaidade, por orgulho - pois em nenhum desses casos a pessoa é "o seu melhor amigo com quem você dorme todos os dias".
Então!
Tenho um coração de jumento.
Fato. Pois sei de tudo isso e ainda assim sou uma pessoa complacente.
Você pode ser inteligente e aprender pelos meus erros (repito).
Ou você pode viver e aprender por si mesma/mesmo.


16/10/2014

A carta

Quando recebeu aquela carta, era ainda muito jovem. Ainda não tinha se tatuado pela primeira vez, ainda não tinha terminado seu primeiro namoro e ainda não tinha mergulhado - em si mesma e nem no mar. Tinha certeza sobre poucas coisas na vida, mas não podia negar seu amor pelo mundo e pela vida - em todas as suas formas. Não sabia quem seria no futuro, não sabia onde estaria em 5 anos, não sabia sobre sua trajetória, não sabia. 

Até então saber que aquela carta era o seu destino. 
Era seu fardo. 
Era sua rota. 
Era seu carma. 
Era seu propósito. 

A carta continha um mapa, com diferentes pontos assinalados. Brevemente conhecido em aulas de geografia e programas de televisão. Pouco acessíveis a muitas pessoas espalhadas pelo mundo. E uma única frase: "Encontre suas próprias rotas. Encontre-se." Aos seus 17 anos, aquilo parecia absurdo, mas nunca saiu de sua lembrança. A carta não tinha remetente, não tinha selo e nem possibilidade de rastreamento. Estava suja e amarrotada, assim como a própria letra de quem escreveu aquelas poucas palavras. No entanto, emanava uma energia única e, especialmente, uma possibilidade antes impensada. 

Alguns anos se passaram, ela tateou suas rotas no escuro: direção indefinida, simplesmente encaminhada. E tinha a nítida sensação de que não era tão dona assim da sua própria vida: por mais que se planejasse, era a vida que escolhia seus caminhos. Nunca quis ser quem era, e ainda assim acabou sendo. Nunca quis trabalhar com aquilo, e ainda assim acabou se destacando. Nunca estar necessariamente com aquelas pessoas, e ainda assim a vida lhe trouxe almas particularmente diferentes - e totalmente responsáveis pelas suas escolhas também. Até que um dia, revirando suas memórias, decidiu seguir a carta - mais uma "autoridade" definindo seu futuro. 

Era só um plano maluco, e não especulava sobre as possibilidades desta escolha. Especulava, sim, no entanto, sobre quem queria dar aquele recado. E qual era a sua intenção ao deixar aquele recado. E então no ápice do seu desapego à lógica, decidiu se programar para a primeira grande aventura. E quando percebeu, já tinha mesmo assumido as rédeas daquela cavalgada. Finalmente escolheu ir, ao invés de ficar parada.

13/10/2014

Quando tudo é possível...


Talvez um homem só tome consciência de sua humanidade quando sonha. O ato de sonhar extrapola qualquer descrição antropológica que um de nossos semelhantes tenha feito. E desde que me entendo por gente espero ansiosamente pelas oportunidades de conquistar cada um dos sonhos que alimentei desde a minha mais remota memória. 

Não se tratava apenas de viajar nas histórias de Cousteau e criar mundos a partir dos seus documentários. Não se travava apenas de imaginar sereias e sacis amigos de baleias voadoras. Não se tratava apenas de imaginar as inúmeras possibilidades de um tratamento contra o câncer a partir das células de defesa dos tubarões. Tudo se tratava da minha humanidade, cultivada nos sonhos de criança.

O que torna uma pessoa, em toda a plenitude do ato de "ser humana", é exatamente a minha vontade de ver tudo com os meus próprios olhos e experimentar cada milagre da vida, fruto das mesmas moléculas de carbono da origem da vida. Encarar de perto todas as possibilidades de existência, encarnadas e conscientes, para que eu compreenda a minha própria insignificância diante da perfeição. 

Sonhos não têm preço, por mais que levem a certos sacrifícios. E cada um tem o direito de buscar aquilo que o torna uma pessoa melhor. A mim cabe o irrisório papel de observadora deste mundo, em toda a sua plenitude, em toda sua versão selvagem e pura. E assim perpetuar o resgate da criança otimista que eu era, e que eu ainda sou.


Meta: Galápagos...

06/10/2014

O fim, por si só

Triste o fim em que a pessoa se revela outra.
Outra tal como deveria ter sido antes de partir.
Outra tal como tenha sido camuflada ao longo do tempo.
Outra, aquela do início, perdida no final.

Triste o fim em que nós nos revelamos outros.
Incrivelmente enfraquecidos por tanto ceder.
Imensamente enfraquecidos por termos tentado tanto.
Impressionantemente enfraquecidos pela frustração.

Triste o fim em que as pessoas não podem mais conviver.
Magoam sem perceber.
São duras para se protegerem.
Tornam-se amargas pela decepção.
Perdem a noção do limite e do respeito ao outro.

Triste o fim em que pessoas antes tão próximas precisam se tornar meros estranhos.
E nunca mais dar boa noite.
E tão cedo aceitar que o outro pode e merece ser feliz mesmo sem você.
E talvez sempre sentir uma pontada de tristeza ao ver fotos antigas antes felizes.

Triste o fim em que a gente precisa cortar todos os elos.
Deixar de lado os meios de contato.
Eliminar pontos de congruência.
Mudar a rotina e se distanciar cruelmente.

Triste o fim em que nenhum dos dois se permite ser leve e honesto.
Negando cada um as suas culpas.
Pedindo perdão quando é tarde demais.
Guardando mágoas sem solução no devido momento.

Triste o fim em que todos os planos perdem o sentido.
E você precisa se reinventar de novo.
Quando você está sem forças, sem esperança.
E especialmente naquele momento em que você só queria que tudo fosse como antes.

Triste o fim.
Esperando o recomeço.
E pacientemente acreditando que vai passar.