01/01/2013

À Liberdade

Eu descobri que os livros não são bons ou ruins. Descobri que os livros nos encontram nas fases certas da vida, ou da consciência, ou não. Concordo que a trilogia de Cinquenta Tons de Cinza é um romance, ficção pura para diversão do público feminino, mas isso não explica por que o livro nos prende - e mais do que isso - nos engole. E decidi escrever exatamente pra refletir sobre como essa trilogia me engoliu com suas 1483 páginas em 7 dias, assim como outros livros já me intoxicaram em diferentes fases da vida. 

Ontem mesmo perguntei para minha mãe como cheguei a Hermann Hesse aos 16 anos. Sinceramente, não sei até que ponto esse é um livro para uma adolescente. Fato é que o "Lobo da Estepe" determinou profundamente várias de minhas ações naquela época, deixando de ser a boa garota para assumir as vontades que uivavam dentro de mim. Da pamonha de sempre à rebelde contida, fato é que me vi refletida no mesmo "sufocamento" do personagem do livro e viver uma vida infeliz, presa nas circunstâncias, tornou-se o meu maior medo. Parece surreal, mas afinal somos feito pára-raios na adolescência: abertos a influências, a seguir mentores, a ter ídolos do mundo pop, a criar mitos, a definir ideologias como filosofias de vida. Eu simplesmente saltei de Richard Bach, do pacífico "Fernão Capelo Gaivota" e "Ilusões" para o "Lobo da Estepe" e "Sidarta", buscando uma elevação, um estado superior de consciência de mim, do outro, do meu destino. E desde então, nunca mais deixei de ser teimosa, petulante, aventureira e passei a assumir os riscos da vida. 

Aos 20, ganhei o livro de um amigo do trabalho (hoje o jornalista Erick Araújo, que está em algum lugar por aí) chamado "Mulher solteira procura homem impotente para relacionamento sério", da autora Gaby Hauptmann. Naquela época, eu sofria com a pressão típica da minha idade: estudar, trabalhar, ser popular, ser atraente, ter uma vida sexual ativa, ter um namorado, me divertir, ser jovem. E eis que surge um livro falando de um passo depois, mas com as mesmas pressões machistas e paradigmáticas estabelecidas por um maldito não sei quem. Virei a noite lendo o livro, 303 páginas, para ficar feito um zumbi nas aulas da faculdade no dia seguinte, mas satisfeita por saber que eu não era a única que simplesmente não estava a fim de priorizar o sexo aos 20. Eu tinha muitos planos na frente e tinha muitas outras coisas pra aproveitar. Eu, que às vezes me sentia um ET em meio às amigas com seus namorados que tanto lhe tomavam o precioso tempo, percebi que estava vivendo uma vida plena da minha liberdade e que não precisava correr. Fato é que seguindo essa filosofia, acabei me tornando uma mulher mais bem resolvida do que muitas que conheço, apesar de só entender isso anos depois...

Mais uma vez através de um presente de minha mãe (não lembro se eu já tinha escolhido o livro ou se ela quem escolheu o título por sorte), aos 22 anos eu descobri Aldous Huxley, em "Admirável Mundo Novo", que não é a letra da música da Pitty. Eu tinha acabado de me formar e pensar no mundo ditado por regras alheias à minha vontade, numa sociedade manipulada, me incomodava - aliás, sempre incomodou desde aquele lobo que descobri aos 16 anos. Tudo que impedia de fazer o que eu planejava, o que eu sonhava, não me deixava apenas infeliz - mas furiosa. E talvez tenha sido importante pra correr atrás dos meus planos como "gente grande", da minha independência - da minha liberdade, melhor dizendo, até onde me fosse possível. Não queria retroceder, regredir, perder o que já tinha conquistado. Huxley não me deixou ser engessada por modelos antiquados, pelo comodismo. Eu aprendi a persistir. 

Li vários livros neste período, poderia citar como cada um mexeu com minhas ideias, mas vou me ater àqueles que estão ligados ao tema do post... Só pra constar os prediletos... "Outra Vez", o segundo diário de Che Guevara. "Em busca do sonho", de Heloísa Schürmann. "Deusa do Mar", de P.C. Cast. "Contato", de Carl Sagan... "Travessuras da menina má", de Mário Vargas Llosa. 

Aos 28, ganhei das minhas queridas amigas (Carla e Rafaela) o tão falado "Comer, Rezar e Amar" e fui devorada. Sem saber, as meninas tinham me jogado no olho do meu próprio furacão pessoal. Não que eu tivesse a sorte de chutar o balde por um ano e viajar pra 3 países diferentes, mas eu tinha acabado de passar por um divórcio difícil (sentimentalmente falando), assim como a personagem. O que ela sentia, era o que eu sentia - decepção, fracasso, medo. E também os momentos de redescoberta dos novos planos, reconstrução da vida, entendimento da crise, aceitação, compaixão e perdão. Os críticos falem o que quiser, mesmo sendo um livro (depois um filme) pra "mulherzinha". Eu estava mesmo numa fase "mulherzinha" e precisava recuperar o meu lobo... Quando eu digo que um livro te encontra, não duvide. Se não acontece com você, isso realmente me preocupa - pois comigo, acontece a todo momento. 

Aos 29, trombei com "O Segredo de Frida Kahlo", de Francisco Haghenbeck, uma biografia desta artista que aprendi a admirar como mulher. Toda sua história de amor à arte e a um homem peculiar, mesmo sofrendo com o egoísmo de Diego, talvez me tenham permitido a reflexão para amenizar as minhas mágoas em relação ao amor... E tenham permitido que eu me envolvesse novamente... A paixão é necessária em tudo que fazemos na vida... Acho que Frida pensava assim... Eu terminei de ler o livro a caminho de Santiago, no Chile, e estava a caminho da minha aventura na Ilha de Páscoa, outro marco na minha vida. Era hora de me permitir arriscar novamente, apesar de ter sido doloroso da última vez. Não sei até que ponto o livro é verdadeiro em todas as partes, mas sinto uma enorme vontade de conhecer os lugares onde Frida viveu, só pra ver se a energia daquela mulher perdura. Pois eu não duvido. E quem sabe eu agradeça por ela ter ajudado a amaciar o meu coração ressentido.

E agora, aos 30, dou de cara com o Sr. Grey, um cara transtornado que precisa ser domesticado. Mas que vale a pena porque é, a princípio, bonito, sedutor, sensual e rico. Apesar de toda a ostentação, o que faz o mulherio querer um Grey em casa não é sua riqueza, nem sua beleza - são seus gestos. É a disposição para o prazer, para conquistar continuamente, para seduzir a qualquer preço, com ou sem os fetiches. E claro, com amor, vira sonho de consumo de qualquer uma... Mas eu posso garantir que a história é boa e prende não é porque fala de sadismo, mas sim de carne, de vontade, de desejo - de coisas que a maioria das pessoas reprime por achar que é pecado saber mais do próprio corpo, entender mais de sexo ou ter fantasias sexuais. A trilogia rompe preconceitos machistas que várias gerações antes da minha foram obrigadas a engolir, a seco. É uma versão romanceada da liberação sexual feminina. Éramos sempre o lado tortuoso da equação - passionais, imprevisíveis, românticas. E acho que o rumo dos fatos acaba mostrando que nem mesmo o macho mais perfeito por fora, é sempre tão racional e binário por dentro... Enfim, o equilíbrio dos tempos modernos onde podemos nos permitir direitos iguais ao prazer e a tantas outras esferas da vida... Volto àquele meu bom e velho lobo, ronronando, com as patas pro ar, brincando... Não é disso que sempre falei? Não é dos vários tons da liberdade, baby? 


A propósito... Personificando Sr. e Sra. Grey, desde que comecei a ler o livro, me vieram à mente os dois atores abaixo, brasileiros. Danilo Sacramento e Priscila Moura Faria (Priscila Sol). Gostaria de saber como cada um imaginou o biotipo dos dois! Essa é a vantagem da leitura: cada um pode imaginar o que quiser! :)


 

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